A Administração Pública pode inscrever o devedor de uma multa não tributária no SPC/SERASA? Pa

A Administração Pública pode inscrever o devedor de uma multa não tributária no SPC/SERASA? Para fazer isso, é necessária a prévia inscrição em dívida ativa?

(interessante questão para os concurseiros)

Vejamos: A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), agência reguladora, lavrou auto de infração contra a empresa Alfa que praticou uma infração administrativa. A multa administrativa é inscrita em dívida ativa? Essa multa pode ser inscrita em dívida ativa? Por certo que, uai.

A multa administrativa pode ser inscrita em dívida ativa.

A inscrição é feita por meio do termo de inscrição na dívida ativa e é realizado no “Livro da Dívida Ativa”. A partir dessa inscrição, é emitida a Certidão de Dívida Ativa (CDA), que é um título executivo extrajudicial. Com a CDA, a Fazenda Pública pode ajuizar a execução fiscal contra o devedor. Os requisitos para a inscrição em dívida ativa estão previstos no art. 202 do CTN.

Dívida ativa

Se o ente público participa de uma relação obrigacional e possui um crédito, ele irá inscrever esse crédito em um “livro” chamado “dívida ativa”.

A dívida ativa pode ser de natureza tributária ou não tributária (art. 39 da Lei nº 4.320/64).

Assim, serão inscritos no livro de dívida ativa tanto os créditos que o poder público possua relacionados com tributos como também aqueles que não derivam (não provêm) da atividade tributária do ente federativo (ex: multas administrativas).

Voltando ao caso concreto: Antes de a ANTT inscrever a multa em dívida ativa, ela inscreveu o nome da empresa no Serasa.

A empresa ajuizou ação anulatória contra a ANTT pedindo o reconhecimento da ilegalidade da inscrição de seu nome no Serasa, por ausência de prévia inscrição em dívida ativa. A autora sustentou que não poderia ser inscrita em um cadastro privado de inadimplentes se nem mesmo houve inscrição do débito em dívida ativa.

Desse modo, pediu a sua exclusão do SERASA.

O juiz julgou o pedido procedente para declarar a ilegalidade da inscrição do nome da autora nos órgãos de proteção ao crédito.

Para este magistrado, segundo previsto no art. 46 da Lei nº 11.457/2008 c/c o art. 37-C da Lei Federal nº 10.522/02 c/c o art. 198, § 3º do CTN, a inscrição do devedor do Poder Público no SPC/SERASA somente pode ocorrer nos casos em que a multa resultante da infração administrativa esteja inscrita em dívida ativa: Art. 46. A Fazenda Nacional poderá celebrar convênios com entidades públicas e privadas para a divulgação de informações previstas nos incisos II e III do art. 3º do art. 198 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional – CTN. Art. 37-C. A Advocacia-Geral da União poderá celebrar os convênios de que trata o art. 46 da Lei no 11.457, de 16 de março de 2007, em relação às informações de pessoas físicas ou jurídicas que tenham débito inscrito em Dívida Ativa das autarquias e fundações públicas federais. Art. 198 (...) § 3º Não é vedada a divulgação de informações relativas a: I – representações fiscais para fins penais; II – inscrições na Dívida Ativa da Fazenda Pública; III – parcelamento ou moratória.

A controvérsia chegou até o ST e o pedido da empresa não foi acolhido.

Quanto a este tema, o STJ já possui o firme entendimento de que: É possível utilizar o sistema Serasajud nos processos de Execução Fiscal. Não há óbice algum ao seu emprego em relação a devedores inscritos em Dívida Ativa que, demandados em juízo, não cumpram a obrigação em cobrança. STJ. 2ª Turma. EDcl no REsp 1.820.766/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 21/3/2022.

Ressalte-se ainda que, no julgamento da ADI 5.886, o Supremo Tribunal Federal considerou constitucional o disposto no art. 20-B, § 3º, II, da Lei n. 10.522/2002, que possibilita a averbação da certidão de dívida ativa em órgãos de registros de bens e direitos, tornando-os indisponíveis, após a conclusão do processo administrativo fiscal, mas em momento anterior ao ajuizamento da execução fiscal. Veja um resumo do que foi decidido: “A Lei nº 13.606/2018 acrescentou o art. 20-B à Lei nº 10.522/2002 prevendo um procedimento para o caso de inscrição de créditos em dívida ativa da União. A alteração que gerou controvérsia foi o § 3º do art. 20-B. Esse dispositivo previu que, se depois de 5 dias contados da notificação, o devedor não pagar a dívida, a Fazenda Pública poderá comunicar essa dívida para que seja anotada nos cadastros restritivos de crédito, como por exemplo, SERASA e SPC. Com isso, o devedor do Fisco fica “negativado” e terá dificuldades de obter créditos e financiamentos.”

Veja a redação do dispositivo legal: Art. 20-B (...) § 3º Não pago o débito no prazo fixado no caput deste artigo, a Fazenda Pública poderá: I - comunicar a inscrição em dívida ativa aos órgãos que operam bancos de dados e cadastros relativos a consumidores e aos serviços de proteção ao crédito e congêneres; e (...);

O STF declarou constitucional o inciso I do § 3º do art. 20-B da Lei 10.522/2002.

Desse modo, é constitucional a comunicação da inscrição em dívida ativa aos órgãos que operam bancos de dados e cadastros relativos a consumidores e aos serviços de proteção ao crédito e congêneres. STF. Plenário ADI 5881/DF ADI 5886/DF ADI 5890/DF ADI 5925/DF ADI 5931/DF e ADI 5932/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgados em 9/12/2020 (Info 1002).

Assim, não existe dúvida de que a ANTT poderia ter inscrito a dívida no SPC / SERASA.

A dúvida, no entanto, era outra: a ANTT poderia ter inscrito no SPC/SERASA antes de fazer a inscrição em dívida ativa? Pois evidente que sim.

Mas e o art. 46 da Lei nº 11.456/2008? Para o STJ, não se aplica à hipótese o disposto no art. 46 da Lei nº 11.457/2008, considerando que esse dispositivo se volta apenas para a Administração Tributária Federal: Art. 46. A Fazenda Nacional poderá celebrar convênios com entidades públicas e privadas para a divulgação de informações previstas nos incisos II e III do art. 3º do art. 198 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional – CTN.

Esse dispositivo determina que, para a divulgação de informações acerca de inscrição em dívida ativa, necessário que a Fazenda Nacional celebre convênios com entidades públicas e privadas.

A presente hipótese, no entanto, não trata da divulgação de informações sobre inscrição em dívida ativa. O que se estava discutindo era a à possibilidade de a Administração Pública inscrever em cadastros os seus inadimplentes, ainda que não haja inscrição prévia em dívida ativa.

A expedição de uma certidão de dívida ativa - CDA visa a comprovar o débito do particular devedor, permitindo que o fisco adote medidas judiciais - por meio do ajuizamento de uma execução fiscal - para perseguir a quantia devida. Diante desse cenário, é possível perceber que a expedição de uma CDA para se autorizar a inscrição do devedor em cadastros de inadimplentes torna mais onerosa para a Administração a busca pelo pagamento de seus créditos.

No julgamento do Tema 1026, destaca-se que o Ministro Og Fernandes, ao julgar o recurso repetitivo REsp n. 1.814.310-RS, entendeu que “sendo medida menos onerosa, a anotação do nome da parte executada em cadastro de inadimplentes pode ser determinada antes de exaurida a busca por bens penhoráveis”.

Em outras palavras, mutatis mutandi, a inscrição em cadastro de inadimplentes tende a efetivar o princípio da menor onerosidade, já que a negativação do nome do devedor é uma medida menos gravosa quando comparada com a necessária inscrição de dívida ativa. Nesse sentido, bastaria ao credor interessado comprovar a dívida com um documento que contenha os elementos necessários para se reconhecer o débito, não sendo, necessariamente, a CDA.

Em suma: A Administração Pública pode inscrever em cadastros de restrição de crédito os seus inadimplentes, ainda que não haja inscrição prévia em dívida ativa. STJ. 2ª Turma. AREsp 2.265.805-ES, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 22/8/2023 (Info 785).

Guaxupé, 28/10/23.

Milton Biagioni Furquim

Milton Furquim
Enviado por Milton Furquim em 28/10/2023
Código do texto: T7919039
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