Recursos no processo penal militar

O Código de Processo Penal Militar, CPPM, Decreto-Lei 1002 de 21 de outubro de 1969, estabelece os recursos cabíveis no processo penal militar, os quais poderão ser interpostos tanto pela defesa como pelo Ministério Público no exercício de suas funções constitucionais estabelecidas no art. 129, I, da Constituição Federal de 1988. Segundo a doutrina, a Constituição de 1988 é uma constituição dogmática, que se contrapõe ao conceito de constituição outorgada, e não promulgada conforme a lição de Ricardo Arnaldo Malheiros Fiúza (Lições de Direito Constitucional e Teoria Geral do Estado).

A parte interessa ao ingressar com um dos recursos previstos no CPPM deverá preencher os requisitos necessários para a sua admissão. Esse requisito é denominado de juízo de prelibação, conforme lição de Fernando Capez, (Curso de Processo Penal). O recorrente deverá demonstrar o interesse, o prejuízo, a adequação, e o recolhimento do preparo quando previsto na lei de organização judiciária, que deverá ser elaborada pelo Estado-membro da Federação, como fez recentemente o Estado de Minas Gerais por meio da Lei Complementar n º 59/2001, que estabeleceu inclusive a organização judiciária militar do Estado.

Na Justiça Militar, não existe o pagamento de custas para que o recorrente possa exercer o direito ao duplo grau de jurisdição, que não é uma garantia constitucional expressa, mas decorrente do princípio da ampla defesa e do contraditório que integram o devido processo lega, due process of law, que foram estabelecidas pelo constituinte de 1988 ao elaborar o art. 5 º da CF, que se aplica aos brasileiros e estrangeiros residentes no país e até mesmo àqueles que estejam de passagem pelo território nacional.

Os recursos enumerados pelo Código de Processo Penal Militar são os seguintes : recurso em sentido estrito, apelação, embargos (infringentes, declaratórios e de nulidade). O Código de Processo ainda estabelece disposições relativas à revisão criminal e ao recurso cabível da decisão judicial que nega a admissão do assistente de acusação. Segundo a doutrina, Fernando Capez, a revisão criminal não é um recurso, mas uma ação que poderá ser proposta pelo condenado, uma vez que pressupõe o trânsito em julgado. Os recursos somente são cabíveis quando não existe uma decisão transitada em julgado. O princípio da inocência somente se aplica aos acusados que ainda não foram condenados por uma decisão transitada em julgada. Por força da CF, somente após o trânsito em julgado é que o condenado poderá ter o seu nome lançado no rol dos culpados. A revisão criminal conforme previsto no Código de Processo Penal poderá ser interposta pelo condenado, por seus familiares caso esteja morto, ou por um advogado constituído, perante a 2 ª instância competente para conhecer da matéria em grau de recurso. O requisito essencial para a interposição da revisão criminal é a existência de uma decisão de mérito transitada em julgado que tenha condenado o interessado a uma das penalidades previstas em lei, como por exemplo pena privativa de liberdade, restritiva de direitos ou de multa, sendo que esta última não encontra previsão no Código de Processo Penal Militar.

Nos Estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul, o Tribunal competente para conhecer as revisões criminais provenientes de julgados dos Conselhos de Justiça, 1 ª instância da Justiça Militar, é o Tribunal de Justiça Militar, ou Tribunal Militar, conforme previsto na Constituição Estadual do Rio Grande do Sul. Por força da Constituição Federal e da Lei de Organização Judiciária, nos demais Estados-membros da Federação, o Tribunal competente para conhecer as revisões criminais provenientes dos Conselhos de Justiça, Permanentes e Especiais, é o Tribunal de Justiça, órgão de cúpula do Poder Judiciário Estadual. Na área federal, o Tribunal competente para conhecer as ações de revisão criminal é o Superior Tribunal Militar, conforme as disposições do Código de Processo Penal Militar, e o regimento interno da Corte que pode ser acessado no site do Tribunal, http://www.stm.gov.br . A matéria sobre a revisão criminal é regula nos arts. 550 usque 562 do CPPM, que encerra o capítulo esclarecendo que não haverá recurso da decisão proferida em sede de revisão. O não preenchimento dos requisitos estabelecidos na norma processual é motivo para o não conhecimento da ação pelo Tribunal competente. O habeas corpus possui previsão expressa no CPPM, arts. 466 usque 480, sendo que este não é cabível no caso de transgressões disciplinares. Deve-se observar, que parte da doutrina entende ser possível o cabimento do writ constitucional em sede de transgressão disciplinar, Eliezer Pereira Martins Direito Administrativo Disciplinar Militar. O CPPM não tratou o habeas corpus no livro III, nulidades e recursos em geral, haja vista que remédio na acepção técnica do termo não é um recurso, mas uma ação constitucional que deverá ser proposta no caso dos militares federais originariamente perante o STM. No caso dos militares estaduais, a ação deverá ser proposta perante os Tribunais Militares, MG, SP e RS, e nos demais Estados perante o Tribunal de Justiça, caso não exista na Lei de Organização Judiciária disposição diversa.

Em atendimento as disposições processuais do Código Militar o writ constitucional não poderá ser interposto perante o juiz de 1 º grau, juiz de direito, ou auditor militar, que atua junto os Conselhos de Justiça, Especial ou Permanente. Na esfera federal e na maioria dos Estados, o habeas corpus somente poderá ser interposto perante a 2 ª instância, sob pena de não ser conhecido.

Percebe-se exposto, que o habeas corpus e a revisão criminal não são recursos, mas ações que poderão ser interpostas pelos interessados desde que preenchidos os requisitos estabelecidos em lei, Código de Processo Penal Militar. A teoria da ação se aplica ao processo penal, e não preenchimento dos requisitos é motivo para o indeferimento do pedido apresentado ao juiz criminal.

No tocante aos embargos declaratórios, o vigente CPPM não estabeleceu a possibilidade de interposição de embargos declaratórios perante o Conselho de Justiça, 1ª instância da Justiça Militar, Federal ou Estadual, mas a doutrina vem entendendo com fundamento no Código de Processo Civil que este seria cabível na forma do disposto no Código de Processo Penal, uma vez que o direito processual penal militar admite a aplicação supletiva deste diploma. Segundo o art. 3 º, alínea a, do CPPM, "Os casos omissos neste Código serão supridos : a) pela legislação de processo penal comum, quando aplicável ao caso concreto e sem prejuízo da índole do processo penal militar". O recurso em sentido estrito é cabível nas situações enumeradas pelo Código de Processo Penal Militar, arts. 516 usque 525, que na sua maioria são semelhantes às estabelecidas no Código de Processo Penal. O prazo para a interposição do recurso é de três dias, art. 518, contados da ciência da decisão proferida pelo juiz, auditor ou o Conselho de Justiça, no exercício de suas atribuições. A apelação que poderá ser interposta no prazo de cinco dias é cabível nos demais casos, arts. 526 usque 37 do CPPM, ou seja, não sendo hipótese de recurso em sentido estrito será cabível a apelação, desde que preenchidos os requisitos para a sua admissão, com fundamento no juízo de prelibação que deve ser preenchido pela parte e verificado pelo juiz quando do recebimento do recurso para o seu processamento.

O Ministério Público caso tenha pleiteado a absolvição do réu em suas alegações finais terá legitimidade para recorrer a 2 ª instância pleiteando a reforma da sentença que condenou o acusado. Se o integrante do MP pleiteou a condenação do acusado, este não poderá em caso de condenação pleitear a sua absolvição, em respeito aos princípios que regem a ação penal, tanto comum, como militar.

A ação penal militar é semelhante a ação penal comum, sujeitando-se aos mesmos princípios estabelecidos em lei. A diferença entre uma e outra se encontra na classificação da ação penal militar que será sempre pública, não se admitindo o instituto da ação penal privada, nem mesmo no caso de crimes contra a honra, calúnia, difamação e injúria.

A doutrina entende com fundamento na Constituição Federal que em tese seria cabível a ação penal privada subsidiária da pública em atendimento as disposições estabelecidas na Constituição Federal de 1988.

O acusado absolvido por insuficiência de provas poderá apelar pleiteando a reforma da decisão proferida pelo Conselho de Justiça, unanimidade ou maioria de votos, uma vez que tem interesse em um outro tipo de decisão, como por exemplo, a absolvição por não ser o autor do fato ou pela inexistência do fato.

Os Tribunais têm entendido que a absolvição por insuficiência de provas não autoriza o retorno do servidor público demitido dos quadros da administração pública após regular processo administrativo onde tenha sido assegurados a ampla defesa e o contraditório. Se a falta for ao mesmo tempo administrativa e penal será necessária uma outra espécie de decisão diversa da insuficiência de provas para que o servidor possa ser reintegrado com todos os direitos e garantias inerentes ao cargo.

Assim, pode-se afirmar que os recursos previstos no Código de Processo Penal Militar possuem disposições semelhantes às previstas no Código de Processo Penal, mas voltadas para a sistemática do Código Castrense que tem por objetivo a efetiva prestação jurisdicional aos seus destinatários, militares federais e estaduais.

Disponível na internet: www.ibccrim.org.br, 13.08.2003