Comentários aos arts. 195 e 196 do Código Penal Militar

Abandono de posto

Art. 195. Abandonar, sem ordem superior, o posto ou lugar de serviço que lhe tenha sido designado, ou o serviço que lhe cumpria, antes de terminá-lo:

Pena - detenção, de três meses a um ano.

Ao ingressar nas Instituições Militares, o civil se não sabe fica sabendo que estará sujeito a disposições que são muitas vezes mais severas do que aquelas que são aplicadas aos trabalhadores civis da iniciativa privada ou mesmo aos empregados públicos e de fundações públicas, e, que se encontram estabelecidas na CLT, Consolidação das Leis do Trabalho. Devido à necessidade de se manter o cumprimento das ordens recebidas, o legislador federal estabeleceu como sendo crime a ser punido o abandono de posto ou lugar de serviço, por parte do militar sem a devida autorização legal de seu superior hierárquico, ou quem tenha competência para fazê-lo. Na seara militar, a ordem recebida desde que seja legal deve ser cumprida, e muitas vezes até mesmo com o sacrifício da própria vida. Desta forma, aquele que não cumpre a ordem recebida e resolve por conta própria abandonar o local para onde se encontra regularmente escalado ficará sujeito às conseqüências legais que foram estabelecidas pelo legislador. O sujeito ativo deste crime, que é um crime militar próprio , uma vez que tem previsão apenas e tão somente no Código Penal Militar e somente pode ser praticado por aquele que possui a condição jurídica de militar, é apenas os militares das forças armadas ou os militares das forças auxiliares. O sujeito passivo deste ilícito penal é o Estado brasileiro, em especial, a administração pública das forças armadas e das forças auxiliares. O elemento objetivo do tipo penal encontra-se representado pelo verbo abandonar, sem ordem superior, o posto ou lugar de serviço que lhe tenha sido designado, ou o serviço que lhe cumpria, antes de terminá-lo. O elemento subjetivo é o dolo. A ação penal cabível na espécie é ação penal pública incondicionada que ficará a cargo do Ministério Público Militar da União, quando se tratar de integrantes das forças armadas e do Ministério Público dos Estados e do Distrito Federal quando se tratar de integrantes da Polícia Militar e dos Corpos de Bombeiros Militares. A pena prevista para o ilícito penal é uma pena de detenção de três meses a um ano, o que em tese permite a aplicação dos benefícios estabelecidos na lei federal 9099/95, apesar de não ser recomendável devido a violação flagrante dos princípios de hierarquia e disciplina. No âmbito da Justiça Militar da União, o Superior Tribunal Militar não tem admitindo a aplicação da lei federal dos

juizados, e inclusive existem orientações para a não aplicação da lei no âmbito da primeira instância. Não se deve esquecer que o magistrado na forma da Constituição Federal possui independência funcional e livre convencimento no exercício de suas funções jurisdicionais. A competência para processar e julgar o infrator acusado da prática deste ilícito penal tanto no âmbito da União, como no âmbito dos Estados e do Distrito Federal é dos Conselhos de Justiça.

Descumprimento de missão

Art. 196. Deixar o militar de desempenhar a missão que lhe foi confiada:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, se o fato não constitui crime mais grave.

O militar integrante das Forças Militares Nacionais conforme tem sido mencionado no decorrer dos comentários ao Código Penal Militar de 1969, e até mesmo em razão dos princípios constitucionais no exercício de suas atividades e de suas atribuições deve cumprir as ordens e também as missões que lhe são confiadas pelas autoridades superiores ou mesmo as autoridades civis as quais estiver subordinado. O cumprimento de ordens e também das missões não é uma faculdade, mas uma obrigação decorrente do dever militar e dos regulamentos disciplinares. Somente quando as ordens forem manifestamente ilegais, e o mesmo se aplica a missão, é que o militar não estará obrigado a cumpri-las. Mas, se existir dúvida quanto à legalidade da ordem, o militar deve cumprir, e neste caso a responsabilidade penal, civil e administrativa, recairá sobre aquele que deu a ordem. Deve-se observar ainda, que este crime alcança não apenas o militar federal integrante das Forças Armadas, mas também o militar estadual, que se encontra sujeito às mesmas obrigações que são previstas para os militares federais. No dia-a-dia das Auditorias Militares Estaduais, os Juízes de Direito do Juízo Militar juntamente com os Conselhos de Justiça são chamados a processar e julgar esta espécie de delito, que no âmbito dos Estados e do Distrito Federal continua sendo da competência do Juízo Colegiado. O sujeito ativo deste crime por ser tratar de um crime propriamente militar é o militar, estadual ou federal, que se encontra na ativa e pertence aos quadros das Forças Armadas ou Forças Auxiliares . O crime de descumprimento de missão é um crime propriamente militar, uma vez que existe apenas no Código Penal Militar e somente pode ser praticado por aquele que for militar. O sujeito passivo do ilícito penal militar é a Administração Pública Militar, Estadual ou Federal. O elemento objetivo, ou

seja, a maneira como o crime pode ser praticado está representada pelo verbo deixar o militar, ou seja, não desempenhar a missão que lhe foi confiada. O elemento subjetivo é o dolo, ou seja, a vontade livre e consciente de praticar o crime. Não existe para o caput deste artigo a prática deste ilícito na forma culposa. A ação penal cabível neste caso é uma ação penal pública incondicionada que no caso do infrator ser militar federal ficará sob a responsabilidade do Ministério Público Militar da União, e no caso do infrator ser um militar estadual ou do Distrito Federal ficará sob a responsabilidade do Ministério Público Estadual ou do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios. A pena prevista para o ilícito é uma pena mínima de seis meses de detenção e uma pena máxima de dois anos de detenção, se o fato praticado não constituir um outro crime, ou seja, um crime mais grave previsto no Código Penal Militar. Devido a natureza do ilícito penal, apesar da pena estabelecida, não é possível a aplicação do instituto da transação ou mesmo da suspensão condicional do processo que se encontram estabelecidos na Lei 9099/95. Alguns autores defendem a possibilidade de aplicação da Lei dos Juizados Especiais Criminais mesmo nas hipóteses de crimes militares próprios, mas este entendimento não é compartilhado por outra corrente especializada do direito penal militar, que busca preservar os princípios que são os fundamentos das Corporações Militares e se encontram expressamente estabelecidos na Constituição Federal de 1988, a hierarquia e a disciplina. No âmbito da Justiça Militar da União não se tem admitido a aplicação da lei dos juizados especiais criminais para nenhum crime previsto no Código Penal Militar.

§ 1º Se é oficial o agente, a pena é aumentada de um terço.

Nesta hipótese, assim como acontece em outras situações estabelecidas expressamente no Código Penal Militar de 1969, se o agente for oficial, Forças Armadas ou mesmo Forças Auxiliares, a sua pena acaba sendo agravada. O legislador federal não teve dúvidas quanto à situação do oficial, que deve ser um exemplo para a sua tropa, subordinados, e, portanto, o primeiro a cumprir com os deveres militares que assumiu quando ingressou na Força Militar a qual pertence. É por isso, que neste crime a pena do oficial foi agravada de um terço, que será aplicado com base na pena fixada pelo Conselho Especial de Justiça. Após a análise das circunstâncias judiciais e legais, é preciso a análise das circunstâncias especiais, e é neste momento que ocorrerá o agravamento da pena do oficial infrator, que não pode e não deve ser igual à pena a ser aplicada a praça que praticou o ilícito penal.

§ 2º Se o agente exercia função de comando, a pena é aumentada de metade.

O oficial deve ser conforme foi mencionado anteriormente um exemplo para a sua tropa, e no caso do comandante esta situação é ainda mais grave. Se o comandante não cumprir com a missão recebida como ficará esta questão em relação àqueles que se encontram subordinados ao seu comando. Em razão destas

questões, foi que o legislador entendeu que a pena do comandante deveria ser aumentada pela metade. Afinal, o exercício do comando não é apenas um procedimento formal. O oficial que se encontra na função de comando deve se dedicar para fazer o melhor, e desta forma servir de paradigma para aqueles que servem em sua unidade.

Modalidade culposa

§ 3º Se a abstenção é culposa:

Pena - detenção, de três meses a um ano.

Na busca de evitar o descumprimento de uma missão, e devido à relevância desta questão para a Administração Pública Militar, o legislador entendeu que a modalidade culposa também deveria ser punida. A regra conforme ensina a doutrina é que apenas o ato doloso seja punido, mas quando o objeto tutelado possui relevância a modalidade culposa também passa a ser punida, tal como ocorre neste caso. Mas, diversamente do caput do artigo, a pena prevista para o infrator é menor. Segundo o estabelecido no parágrafo o agente ficará sujeito a uma pena mínima de três meses e a uma pena máxima de um ano. Mais uma vez, por se tratar de um crime militar próprio a aplicação dos institutos da transação ou mesmo da suspensão não são recomendáveis. No âmbito da Justiça Militar da União existe inclusive uma súmula do STM, que não é vinculante, que diz expressamente que a Lei 9099/05 não se aplica na Justiça Militar.

Proibida a reprodução no todo ou em parte sem citar a fonte em atendimento a lei federal que cuida dos direitos autorais no Brasil.