LINGUAGEM JURÍDICA: SIMPLICIDADE E FOCO

Resumo

O título em epígrafe esclarece sobre a necessidade de uma maior objetividade na linguagem jurídica. Demonstra, ainda, como o excesso de rebuscamento nos textos jurídicos atrapalha o andamento do processo, dificulta, por demais, o entendimento do intérprete e afasta do arcabouço judiciário, uma boa parcela do povo brasileiro - o jurisdicionado, cujo grau de escolaridade é precário e nunca tiveram acesso a uma linguagem com terminologias tão técnicas que, não contribui, em nada, para a aplicabilidade da justiça.

Introdução

Atualmente, o Direito é uma ciência que ainda mantém uma relação muito próxima às suas tradições. Haja vista, a insistência de alguns operadores em manter um vocabulário altamente rebuscado, opaco e repleto de termos técnicos. Infelizmente, acreditam que isso seja demonstração de cultura.

É muito comum o perigoso vínculo entre altivez, ostentação e vaidade no arcabouço jurídico. Alguns profissionais exageram na dose de presunção, acham que estão em um patamar cultural muito mais elevado do que a população brasileira, e fazem uso de um linguajar intocável, impenetrável e inacessível a maior parte da sociedade.

Justificam essa atitude afirmando que se trata de linguagem técnica, peculiar a ciência do Direito.

A Ciência que trata das normas obrigatórias que disciplinam as relações dos homens em sociedade, não deve fazer uso de uma linguagem tão técnica, própria. Deve utilizar-se de um vocabulário acessível a todos. Sem exibicionismos e vaidades. Sem tantas terminologias e sofisticações que só contribuem para a opacidade do discurso.

Uma linguagem muito rebuscada atrapalha a interlocução. O uso de termos antiquados, anacrônicos não é sabedoria; mas sim, falta dela. Segundo o poeta Thiago de Mello, “falar difícil é fácil. O difícil é falar fácil”. E ainda, Carlos Drummond de Andrade: “escrever bem é a arte de cortar palavras”.

A sofisticação excessiva, na linguagem jurídica, afasta do arcabouço judiciário o cidadão brasileiro comum - de baixa escolaridade - não acostumado a tantos termos técnicos. Às vezes, se torna incompreensível até para profissionais do meio. Vejamos como exemplo, o ocorrido na determinação da prisão de um assaltante de Barra Velha – comarca de Santa Catarina:

“Encaminhe o acusado ao ergástulo público”. Assim determinou o juiz Ricardo Roesler. Dois dias se passaram e a ordem ainda não havia sido cumprida, pois ninguém sabia o significado de “ergástulo” – palavra arcaica usada como sinônimo de cadeia.

Vejamos o que diz a doutrina, como elucida Paulo César de Carvalho:

“Outra questão importante e muito comum é a confusão do emprego de termos técnicos com o uso de palavras arcaicas. Imagine agora um advogado dizendo a outro o seguinte, a respeito de um cliente: ‘o réu vive de espórtula, tanto que é notória sua cacosmia’. Se você não é do meio, seguramente não saberia dizer com outras palavras o que ouviu. Aliás, muitos do meio também não conseguiriam traduzir o enunciado. Seria muito mais fácil compreender a mensagem se, em lugar de ‘espórtula’, o advogado dissesse que o réu dependia de donativos; e, em vez de ‘ cacosmia’, afirmasse que vivia em ambiente miserável”.

Sobre o mesmo tema, analisemos os preceitos de Regina Toledo Damião e Antônio Henriques:

“Narrativas dos fatos e fundamentos jurídicos do pedido”

“A ausência de uma narrativa clara, que faça conhecer a pretensão do autor, é um dos motivos ensejadores do art. 284, que se refere a defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento do mérito”.

“O pedido e suas especificações”

“O pedido é o próprio objeto da ação; assim, há de ser claro...”

E, ainda, os ditames de Hegel: “quem exagera no argumento,

prejudica a causa”.

Conclusão

A sociedade brasileira necessita, em caráter de urgência, que a linguagem utilizada no sistema jurídico proporcione rapidez e eficácia. Seja clara, objetiva e de fácil acesso. Portanto, chega de falsa erudição. Uma escrita prolixa e excessivamente rebuscada afeta a própria efetividade da prestação jurisdicional. O nosso judiciário apresenta muitas dificuldades - uma delas, é a demora em se obter uma sentença. Com quase 1/5 da população brasileira aguardando uma decisão judicial, é inconcebível tanta complexidade técnica nos textos legais. Conforme Alexandre Vidigal de Oliveira, no artigo “Processo virtual e morosidade real”, afirmou:

“o mal maior do judiciário não está na morosidade do tramitar, e sim no atraso em se julgar. 43 milhões de processos aguardam julgamento em todo país, segundo dados recentes do Conselho Nacional de Justiça (fevereiro/2008). O processo em fase de julgamento não está ‘tramitando’; apenas aguarda ser julgado. É como se 1/5 da população brasileira estivesse na fila esperando uma decisão judicial”.

Em suma, com base nos esclarecimentos acima e considerando tudo que foi abordado, comprova-se a necessidade de mudança cultural por parte de alguns operadores do Direito, que não podem se apegar a uma falsa erudição, a valores retrógrados, arcaicos, que prejudicam a boa aplicabilidade da justiça, vão de encontro aos anseios sociais e aos princípios doutrinários, colocam em dúvida todo o ordenamento jurídico e comprometem a toda sociedade.

________________________________________

Referências

CAMPELLINI; Marília – Campanha pode extinguir linguagem rebuscada nos meios jurídicos – Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul - Disponível em: http://www.tj.ms.gov.br/noticias/materia.php?cod=6766

CARVALHO; Paulo César de. - Discurso em julgamento - Revista Discutindo Língua Portuguesa. São Paulo: Escala Educacional, ano I, n. 3, p. 47. Disponível em: http://www.discutindolinguaportuguesa.com.br/reporte03juridiques.asp

HENRIQUES; Antonio e DAMIÃO; Regina Toledo – Curso de Português Jurídico - Décima Edição – Ed. Atlas – 2008

SILVA; Cláudia Dantas F. da – A Ponte – Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Disponível em: http://www.amb.com.br/portal/juridiques/1lugar_estudante.doc

OLIVEIRA, Alexandre Vidigal de. Processo virtual e morosidade real. www.ibrajus.org.br, Disponível em: http://www.ibrajus.org.br/revista/artigo.asp?idArtigo=57. Acesso em 10 de setembro de 2009