Comentários ao art. 136, do Código Penal Militar

Hostilidade contra país estrangeiro

Art. 136. Praticar o militar ato de hostilidade contra país estrangeiro, expondo o Brasil a perigo de guerra:

Pena - reclusão, de oito a quinze anos.

O artigo sob análise inaugura a parte especial do Código Penal Militar tratando-se de um crime que se insere no título referente aos crimes contra a segurança externa do país e que somente pode ser praticado por militar. Antes do advento da Emenda Constitucional nº 18, poderia se afirmar que este crime somente seria praticado por militares das Forças Armadas até porque a legislação militar, em especial o Código Penal Militar, foi feito para ser aplicado a princípio apenas aos integrantes das Forças Armadas. Atualmente, os militares estaduais desde que venham a exaurir o tipo penal também poderão ser sujeitos ativos do art. 136, do CPM. Desta forma, verifica-se que o sujeito ativo do ilícito, que é de natureza propriamente militar, são os militares, federais ou estaduais, que se encontram na ativa, mas nada impede que um militar da reserva ou mesmo um militar reformado utilizando-se de sua condição possa praticar este crime. O civil que tenha sido incorporado as Forças Armadas também poderá ser sujeito ativo deste ilícito contra a segurança nacional, mas em razão de sua condição de militar. O sujeito passivo deste crime seria o país estrangeiro que sofreu o ato de hostilidade que possa expor o Brasil a perigo de guerra, como por exemplo, no caso de militares brasileiros desrespeitarem os limites de fronteira e ainda destruírem bens pertencentes ao país invadido, o que poderá levar inclusive a uma declaração de guerra por parte do país que se sentirá ofendido com este procedimento. O elemento objetivo deste tipo penal está representado pelo verbo praticar complementado pela ação de hostilidade contra país estrangeiro que possa expor perigo de guerra. Em razão desta disposição, por exemplo, se um militar brasileiro entrar em um país estrangeiro sem o devido visto ou passaporte, este ato por si só não pode ser considerado um ato de hostilidade capaz de expor o Brasil a perigo de guerra. Na realidade, a lei não definiu o que venha a ser ato de hostilidade, mas este pode ser entendido como sendo, por exemplo, um ataque a uma guarnição de fronteira sem que este tenha pratica qualquer ato que justifique a reação dos militares brasileiros. O ataque a uma vila de fronteira ou mesmo a invasão de uma empresa estrangeira em solo brasileiro. Ainda a respeito da questão da prática de hostilidade capaz de expor o Brasil a perigo de guerra, não se deve esquecer que no ano de 2006 o Brasil teve uma empresa petrolífera invadida na Bolívia, mas apesar disto não apresentou uma resposta condizente com as tradições militares brasileiras. A questão serve para ser analisada em razão deste artigo, pois se um militar brasileiro tivesse praticado um ato semelhante contra uma estatal de um país estrangeiro este ato poderia ser considerado como sendo um ato de hostilidade capaz de expor o Brasil a perigo de guerra em razão da resposta que poderia ser adotada pelo ofendido que não teria a mesma compreensão apresentada pela diplomacia brasileira. O elemento subjetivo deste ilícito é o dolo, a vontade livre e consciente de praticar ato de hostilidade contra país estrangeiro sem que exista uma ordem para tanto. A ação penal neste ilícito é de natureza pública sob a responsabilidade a princípio do Ministério Público Militar da União , mediante requisição do Ministro da Força a qual pertence o infrator. Por força das alterações ocorridas na estrutura das Forças Armadas, a requisição caberá ao Ministro da Defesa, mas nada impede que em razão do sujeito ativo e a maneira como o crime venha a ser praticado que este ilícito possa ser processado e julgado perante a Justiça Militar Estadual do estado de origem do infrator ou mesmo perante a Justiça Militar do Distrito Federal, situação que é mais difícil de ocorrer devido às funções que são exercidas pelos militares estaduais dentro do Estado democrático de Direito. Antes do advento da Emenda Constitucional n 18 tal possibilidade seria impossível em razão dos policiais militares e bombeiros militares em muitos casos não serem considerados militares para os efeitos penais militares. Atualmente, esta questão se encontra superada, existindo inclusive precedentes do Superior Tribunal Militar, S.T,M, mudando o entendimento da Corte a respeito da natureza dos integrantes das Corporações Militares Estaduais. A sanção prevista para o ilícito devido às conseqüências que podem advir para o país é considerável. A pena mínima conforme o estabelecido neste artigo será de oito anos e a pena máxima de quinze anos. Em razão do quantum estabelecido, o condenado caso seja aplicada a Lei de Execução Penal, iniciará o cumprimento da pena em regime semi-aberto, e caso seja condenado a uma pena superior a oito anos iniciará o cumprimento da pena em regime fechado. Além disso, em razão da sanção que é estabelecida, se o infrator pertencer ao quadro de praças caso venha a ser condenado em definitivo, trânsito em julgado, será excluído da Corporação, e caso seja oficial será submetido a Conselho de Justiça. No caso das praças das Forças Auxiliares a perda da graduação não é imediata e deve ocorrer na forma do Conselho de Justificação em atendimento ao estabelecido na Constituição Federal de 1988 .

Resultado mais grave

§ 1º Se resulta ruptura de relações diplomáticas, represália ou retorsão:

Pena - reclusão, de dez a vinte e quatro anos.

O parágrafo sob comento ainda estabelece outras sanções tomando como base o resultado do ato praticado pelo infrator. Enquanto o caput estabelece a possibilidade de perigo de guerra, o parágrafo primeiro trabalha com um resultado efetivo, qual seja, a ruptura de relações diplomáticas, represália ou mesmo retorsão, por parte do país que sofreu o ato de hostilidade praticado por militar brasileiro. Neste caso, mantidos os comentários anteriores quanto ao sujeito ativo, passivo, elemento objetivo e elemento subjetivo, ação penal, fica a devida observação quanto a sanção que deverá ser imposta pelo Conselho de Justiça, Especial ou Permanente, ou mesmo pelo Superior Tribunal Militar caso o infrator seja oficial General da Marinha do Brasil, Exército Brasileiro ou mesmo Força Aérea Brasileira, a qual será de no mínimo dez anos e de no máximo vinte e quatro anos, o que demonstra que o assunto foi tratada de forma severa pelo legislador, preocupado em evitar que o Brasil se envolva em conflitos desnecessários, que servem apenas para desgastar a nação no âmbito internacional e causar prejuízos no aspecto econômico.

§ 2º Se resulta guerra:

Pena - reclusão, de doze a trinta anos.

O parágrafo segundo assim como o parágrafo anterior também trabalha com o resultado decorrente da conduta pratica pelo agente militar. Segundo o estabelecido na norma penal militar sob análise, se o país ofendido resolver decretar guerra contra o Brasil, o infrator ficará sujeito à pena mínima de doze anos e a uma pena máxima de trinta anos. Mais uma vez o legislador estabeleceu uma sanção severa para aquele que desrespeita os princípios estabelecidos na seara militar, e que também poder ser encontrados na Constituição Federal de 1988, que estabelece que o Brasil respeitará a autonomia das demais nações, o que significa que o Brasil também deve ser respeitado no cenário internacional, o que exige investimentos nas Forças Militares na busca da preservação da soberania nacional e das riquezas naturais existentes no país. Percebe-se que tanto o parágrafo primeiro como o parágrafo segundo são figuras qualificadas do art. 136, do Código Penal Militar. Atualmente, não se tem notícias da prática deste ilícito penal militar, seja na modalidade estabelecida no caput, ou mesmo aquela estabelecida nos parágrafos, mas o legislador de forma previdente estabeleceu esta disposição penal para se evitar que o Brasil venha a se envolver conforme já foi mencionado em conflitos desnecessários, o que não significa que o Brasil tenha que aceitar atos de hostilidades contra o território nacional sem apresentar a devida resposta, mas esta decisão não é de caráter pessoal. A adoção de qualquer medida no cenário militar cabe ao Presidente da República, ao Ministro da Defesa, e aos Comandantes Militares na forma estabelecida na Constituição Federal de 1988.

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Nota: O escritor é autor da obra Direito Administrativo Militar - Teoria e Prática, Editora Lumen Juris que foi indicado na bibliografia da Marinha do Brasil para o ingresso no quadro de oficiais técnicos 2009, e da obra Direito Penal Militar - Parte Geral, Editora Líder, Belo Horizonte.

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