POEMA NÃO DEVE SER ENIGMA

Alguns poemas, a uma primeira olhada, parecem esteticamente bons, apresentam alguma criatividade, todavia o problema é o seu hermetismo: não há como entrar na sua significância íntima. Sem entendimento, existe o poema com Poesia? Ela não necessita ser dos domínios do Fraterno? Abrir-se ao outro polo, ao leitor? Corporificar-se esteticamente com palavras bonitas e bem postas não basta. Muito menos um mero amontoado de palavras difíceis e/ou pouco usadas no idioma de sua lavratura. Há poemas que são verdadeiros bestialógicos. De entendimento muito difícil, estas peças herméticas são tão fechadas que impedem a sua compreensão. Não há como penetrar nelas. O próprio autor não as consegue revelar coerentemente quanto ao tema, sentido e abrangência. São típicas criações do alter ego que possui inúmeros temores e medos. Ocorrem, por vezes, em cérebros danificados pelo uso das drogas. Confusas e imbricadas, atendem somente ao obscuro psicológico. E os seus autores, nas rodas literárias, ficam se fazendo de sobejos, ao lhe explicar as charadas de cada verso. A estes curiosos exemplares eu denomino “po/enigma”. Porém a compreensão da peça poética depende do seu leitor. Este pode ser de fraca compreensão pessoal, não lhe conseguindo chegar ao âmago, nem lhe compreender a abrangência temática. Pode ocorrer, também, que o leitor não tenha vivido situações pessoais que lhe permitam a compreensão por associação de ideias. Porque a Poesia não é gênero pra qualquer um: leitor e o alter ego do autor se envolvem com o poema como se fora uma peça de roupa colada ao corpo. Ajustam-se ao primeiro encontro, mesmo que jamais tenham sido anteriormente apresentados. O poema é seta direta no alvo. Aos menos avisados, somente avulta a silhueta. Estes confundem forma e fundo. O leitor de poema é tão especial quanto o autor. A palavra, em poesia, vem sempre disfarçada, porém é objeto do Bem e do Amor. A confusa expressão escrita do subjetivismo do autor não pode ser vista como poema. Na arte poética, o chamado “abstracionismo” tão decantado em arte plástica, não me parece plausível como escola. O poema é flor pra ser admirada, vista, revista. Quando o poema tem conteúdo difícil, não há como sentir-lhe o perfume ou a sua abrangência. Os versos ensinam a pensar com doçura, mesmo que denuncie os abusos e o Mal. Porém, para que possam produzir algum efeito, precisam ser entendidos, vividos. O poema tem personalidade própria: relata a si mesmo.

– Do livro A POESIA SEM SEGREDOS, 2008/2012.

http://recantodasletras.uol.com.br/teorialiteraria/1768323