A tragédia de existir e a duplicidade da realidade trágica por Clément Rosset

Sebástien Charles introduz os fundamentos de Rosset alegando que esse filósofo, deveria, por sua profundidade filosófica, seguida de sua simples linguagem na exposição de seu pensamento, ser reconhecido como um dos grandes filósofos contemporâneos. Clément Rosset, na sua obra L’anti-nature desculpa-se com seus leitores pelo academicismo presente ali, pois a mesma fez parte de sua tese de doutorado e o autor parece incomodado com tamanha formalidade. Por tanto, seguindo o estilo de Rosset, pretendo aqui, ser o mais fiel possível a essência de Rosset, evitando o academicismo em demasia.

A obra de Rosset Logique du pire apresentada por Sebástien Charles, foi a que mais prendeu minha atenção, pois nela, Rosset fala sobre a tragédia da existência humana. Clément explica que a alegria é a base humana para suportar a existência. Para ele, o mundo mesmo não existe, pois tudo o que está no mundo vai desaparecer, tudo que desaparece não existe mais.

Como humanos, temos a necessidade de existir, temos a necessidade de sermos vistos e reconhecidos, porém esse tipo de pensamento, cria no filósofo, a questão: se tirarmos de nós, nosso nome, nosso endereço, nossa identidade criada ao longo do tempo, quem/o que seriamos? Não sabemos responder, nem mesmo sabemos se seriamos alguma coisa. Sendo nada, não existiríamos. A maldição humana e não aceitar sua inexistência. Nossa realidade é essa, simplesmente participar do ciclo da vida, mas a todo momento necessitamos existir, ter um sentido.

E eis, a tragédia do existir, a falta da capacidade humana de não saber não existir. Rosset ensina que para tornar a tragédia da existência menos agonizante, dotamos a vida de características de festa. Vivemos tempos limitados de alegria, para não aceitar a aparência do real.

Nos diz Clément Rosset em sua obra Logique du pire que: Toda a alegria que pretendesse desconsiderar o trágico ou ignorá-lo graças a aparente e passageira plenitude de sua felicidade, é necessariamente uma alegria falsificada, e aliás, tão logo desmentida por um nada de experiência ou de lucidez”. Nossa lucidez se manifesta, ao compreendermos o real e nos devolver a ele, isso significa: nos devolvemos a nós mesmos, ignoramos tudo que nos causa os falsos sentidos, nos doando ao real, nos doamos a vida. Finalizo este parágrafo citando uma explicação de Sébastien “Ora, para Rosset, o que é preciso pensar é um mundo tão desnaturado que não se presta a um influxo humano de sentido.”

Clément Rosset tem sua linha filosófica inspirada em Nietzsche, e apropria-se do pensamento nietzschiano de que a arte é um dos modos de embelezar a tragédia de viver. Sendo assim, mesmo sendo grande seguidor de Nietzsche, Rosset crítica sua ideia referente ao fato da arte ser uma forma de embelezar a tragédia da existência, argumentando que apesar de mais belo que o real possa nos parecer a vista de nossa felicidade, o seu real tautológico sempre se sobrepõem ao real interpretado.

Segundo Charles Sébastien o real para Rosset, se define como idiota, simples, particular e único. E por ser tão simples acaba por se tornar inaceitável, logo é ocultado e de difícil afirmação. Bom, exemplifico a omissão do real tautológico, expondo a crença humana, a mais comum das fugas do real, pois nesse real imaginário e interpretado nos vemos em um lugar repleto de alegria e paz. Para um crente, que vê a tragédia, a denomina de Demônio de coisa ruim, pois esse é insuportável ao sentimento humano. As questões do real são aprofundadas na obra Le réel et son double.

Charles Sébastien, esclarece que para Rosset “filosofar é, então, assumir seu destino dando razão ao real e recusando sua duplicação.” Ao encontrarmos conosco na realidade tautológica aceitamos o destino do ciclo da vida, sem ignorar a morte, aceitando o fato que essa faz parte da vida, e que ora ou outra, deixaremos de existir. Filosofamos quando, aceitamos nosso presente, sem precisar de um real belo e ilusório para conseguir suprir nossa falta de sentido perante nossa existência, vivendo o real como ele é.

Com a elucidação sobre o tema, proporcionada por Charles Sebástien compreende-se que a alegria é um gozo por consequência da existência. E não há mais jubiloso que a existência, por isso a mesma deve ser considerada com toda lucidez de espirito.

Encerro essa resenha, recordando um pensamento do professor Francisco Fianco (Chico) em uma de suas aulas que estive presente, onde ele dizia “a coisa mais linda da vida, é viver sua falta de sentido.” Essa citação, nos excita a aceitar o real tautológico e nos apropriar da lucidez de espirito anteriormente citada por Charles Sebátien.

Referencias:

SÉBASTIEN, Charles, Comte-Sponville, Conche, Ferry, Lipovestsky, Onfray, Rosset: é possível viver o que eles pensam? Sébastien Charles; trad. Maria Lucia Machado, São Paulo: Editora Barcarolla, 2006.

ROSSET, Clément, 1939, O real e seu duplo: ensaio sobre a ilusão, trad. José Thomaz Brum, 2 ed., revista, Rio de Janeiro, Sabor literário, 2008.

Camila Belini
Enviado por Camila Belini em 14/06/2017
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