Resenha de Filosofia

CHISHOLM, Roderick M. Teoria do Conhecimento. Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1969.

Possivelmente, oculto em uma prateleira de biblioteca, de uma livraria ou, simplesmente, desconhecido de grande parte dos consumidores, o livro Teoria do conhecimento ainda aguarda a sua descoberta, a sua leitura e o reconhecimento de seus valores. Esta obra deve estar sofrendo os malefícios do culto ao gênio, embora contenha teorias expressivas de excelentes pensadores contemporâneos. Talvez faltasse na capa a indicação de um porta-estandarte da ciência, capaz de despertar a atenção candente publicista do momento.

O autor é muito seguro em sua assertiva, assim como é variável a qualidade de cada tema proposto. O nível, porém, de seu trabalho, mostra a seriedade com que se dedicou ao assunto. Registra-se, desde logo, para aquele que trabalha com o tema “Teoria do Conhecimento”, ser este mais que um tema; na verdade, uma disciplina que deveria ser mais bem trabalhada na educação básica das instituições de ensino.

O cuidado com que, na obra, os temas são tratados é um dos pontos altos do livro, como, por exemplo, a sua preocupação em explicar o que é o problema do “Teeteto”, buscando destacar a grande questão levantada por Platão: Qual é a distinção entre conhecimento e opinião certa, ou verdadeira?

Dispondo-se então a colocar as muitas espécies de conhecimento sob uma só definição, analisa-se, porém, a contínua busca de Platão - que teve Sócrates como “Mentor” - em desmentir a subjetividade gnosiológica dos sofistas, que afirmavam que os sentidos determinassem o conhecimento, uma vez que o modo platônico de se abordar a questão é sugerir ou supor primeiro - que se um homem conhece e outro homem tem opinião certa - não sabe então o primeiro homem que tem tudo o que o segundo homem tem e ainda algo mais. Assim, vê-se que, segundo Platão, é possível chegar ao conhecimento através da razão.

Após a Introdução, a obra divide-se sete capítulos distintos onde, no primeiro, investiga-se o conhecimento como um conceito ético a partir do tema “Conhecimento e Opinião Verdadeira”; mas será no segundo que se busca resgatar as Interrogações Socráticas que evidencia suas refutações às quatro definições tradicionais do conhecimento como crença verdadeira justificada e proposta pelo matemático Teeteto de Atenas. No terceiro, apresenta-se o discurso sobre a relação entre o Diretamente Evidente e o Indiretamente Evidente, onde se busca teorizar que o conhecimento é - de um lado - resultado de uma relação dedutiva e - de outro - que não é o resultado de uma relação indutiva, fazendo assim destacar a Teoria de Carnéades na qual se afirma que tudo é “Provável”.

Todavia, será no quarto capítulo da obra que nos deparamos com questões relacionadas sobre as “Fontes do Conhecimento”, seguidas de deduções sobre o “Conhecimento de Certo e de Errado”, como um Exemplo, fazendo prevalecer a Teoria sobre o Conhecimento de Coisas Externas, como outro Exemplo, culminando em um Exemplo Final que nos levará às Verdades da Razão, cujo tema será discutido no capítulo cinco onde, para tal discussão, retoma-se o pensar filosófico sobre “Uma Concepção Tradicional”, buscando-se dividir o capítulo com temáticas relacionadas à Inclusão e Exclusão do Ser, perpassando sobre teorias de que o Conhecimento de Necessidade Não É “A Posteriori” e um breve relacionamento sobre Conhecimento “A Priori”, tendo em vista o Cepticismo, o “Psicologismo” e o “Linguisticismo” apimentados pela temática da Verdade Lógica e Analítica, bem como, o tema “A Priori” Sintético.

Destaca-se na obra, o capítulo seis, onde em virtude da posição das aparências, o autor traz à tona também o Problema do Atomista Demócrito, que considerou, sobretudo, que o fato implica não só que não percebamos o que é que pensamos perceber, mas também que as coisas externas de maneira alguma são aquilo que tendemos para acreditar que são. Para Demócrito, as aparências das coisas mudam com a condição do nosso corpo e as influências que afluem para ele ou resistem a ele.

Alguns filósofos, a fim de evitarem tais conclusões extremas, foram levados a por em dúvida essas premissas de Demócrito. Assim, referindo-se a Demócrito, Aristóteles escreverá que “os primeiros estudiosos da Natureza estavam equivocados em sua opinião”. Deste modo, a obra apresenta soluções por intermédio desse grande pensador Aristóteles e aponta-nos que a Teoria Adverbial e o Problema Fenomenológico são resultados de Aparências e Processos Cerebrais que nos conduzem a Verdade, lembrando-nos que a Verdade só é Verdade enquanto não aparece outra Verdade para contestá-la; e, pergunta: O que é a Verdade?

Nesse sentido, a resposta à questão anterior será apresentada no capítulo oito da referida obra que, para respondê-la, inicia-o levantando-se a seguinte questão: Estados de Coisas? Sim, a partir daí, expõem-se noções sobre “Verdadeiro” e “Falso” e reporta-se a Epimênides – poeta, filósofo e místico grego, cujo pensar religioso se contrapunha a todos os demais de sua época, pois cria em apenas um só Deus e lançava criticas severas aos religiosos de seu tempo, que haviam construído mais estátuas em homenagem aos deuses do que o número de habitantes da cidade e, para combater esta praga das estátuas, mandou construir um altar talhando-o com o nome do “Deus Desconhecido”. Então seria a Verdade uma crença ou uma asserção? Não. Ainda neste capítulo discutem-se também temas importantes como o “Pragmatismo” e “O Verdadeiro e o Evidente”.

De maneira geral, o autor consegue com muita propriedade destacar a idéia principal do modo de pensar a Teoria do Conhecimento, referenciando-se à extrema valorização do Saber, da prática cotidiana do indivíduo que caminha na busca do desenvolvimento intelectual e, ao mesmo tempo, fundamentando-se teoricamente no pensamento das antigas Escolas Gregas e, delineando Tempo e Espaço, acredita-se que a base para se chegar a produção do Conhecimento deve estabelecer-se nas premissas socráticas, considerando, em especial, a velha máxima daquele pensador que combateu, em seu tempo, todos os tipos de sofismas ao afirmar: “Só sei que nada sei” , erigindo, assim, os fundamentos sobre os quais seriam partejados novos “Saberes” e, consequente, uma nova forma de “Pensar”.

Portanto, para Chisholm, a evolução do pensamento, baseia-se na epistemologia e tem como ponto de partida, além daquela questão platônica: Qual é a distinção entre conhecimento e opinião verdadeira? Outras questões que elaborou com a finalidade de nos orientar na busca do Conhecimento que, aliás, são extremamente pertinentes e que servem de pistas para o entendimento da obra, como também para se tê-la como fonte de pesquisa. Assim, destacam-se indagações como, por exemplo, em relação ao Homem: que falta ao primeiro? Em relação à Evidência: o que é prova evidente e como decidiremos, em qualquer caso determinado, se temos ou não prova? Em relação ao Ato e à inferência: O que significa um ato estar certo e como decidiremos, em qualquer caso determinado, se um certo ato está certo ou não? O que significa uma inferência ser válida e como decidiremos, num determinado caso, se uma dada inferência é ou não válida? Em relação às Crenças: mas que aconteceria se disséssemos, a respeito de um homem, que algumas de suas crenças são verdadeiras, sem especificarmos que crenças? Que propriedade, nesse caso, estaríamos atribuindo à sua crença? Em relação à Verdade: estaremos dizendo algo que é verdadeiro ou dizendo algo que é falso?

E, por fim, sem desmerecer qualquer outra obra, Teoria do Conhecimento é especialmente muito proveitosa. Refletir sobre a construção do pensamento em geral, nas concepções dos pensadores gregos no afã de se chegar à gênese do desenvolvimento intelectual é, sem sombra de dúvidas, uma oportunidade única que nos faz crescer. Ainda mais quando se trata do conhecimento intrínseco ao ser humano, pois raras são as obras que enfatizam este tema fundamentando-se nas assertivas dos pensadores das inúmeras Escolas Filosóficas gregas, tanto as que se estabeleceram antes de Sócrates, bem como, as posteriores a esse ícone divisor do conhecimento humano. Fato que nos leva a entender de forma explicitamente clara, a passagem da Filosofia Natural à Filosofia Humana. E mais, sua concepção retardatária nas instituições de ensino e consequentemente sua evolução recente.

Com esta obra abre-se um dos fundamentais pontos de exame que nos permite refletir sobre a produção do conhecimento no presente e obriga-nos, também, a levantarmos duas questões que acreditamos ser de grande importância: se a Filosofia transita pelo ensino, então a questão educacional impõe criatividade e menos repetição? Será que é isso mesmo que está acontecendo?