RESENHA ANALÍTICA DO LIVRO A HORA DA LUTA DE ÁLVARO CARDOSO GOMES

RESENHA ANALÍTICA DO LIVRO A HORA DA LUTA DE ÁLVARO CARDOSO GOMES

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“Este é tempo de divisas, tempo de gente cortada... É tempo de meio silêncio, de boca gelada e murmúrio, palavra indireta, aviso na esquina.”

(Carlos Drummond de Andrade)

À Hora da Luta, escrito por Álvaro Cardoso Gomes, pela editora FTD, 1999, é, sobretudo, um mergulho na década de 60, numa simbólica remontagem da juventude brasileira no início da década, com um discurso revolucionário que nos remete a livros com a mesma temática, tais como Os Subterrâneos da Liberdade, de Jorge Amado.

Dividida em capítulos, 96 ao todo, os quais são curtos, o que faz a obra assemelhar-se a um livro de contos, ambientada em São Paulo. A ditadura militar da era Goulart e vésperas do golpe de 64 são retratadas com maestria por Álvaro Cardoso, criando um panorama histórico fortalecido por ideais revolucionários. A turbulência nacional em todo o país, os conflitos existenciais e a falta de perspectivas, faz com que nas universidades surjam idealistas com visão imaginária, de um mundo capaz de ser transformado, sem miséria ou qualquer tipo de opressão. Esse período foi caracterizado pela falta de democracia, supressão de direitos constitucionais, censura, perseguição política e repressão aos que eram contra o regime militar.

A obra é narrada em primeira pessoa pelo personagem principal, Beto, que sai do interior para morar em São Paulo em busca de uma vida melhor. São vários os motivos que o faz mudar-se, principalmente a desilusão. A USP é palco de encontros de estudantes de esquerda e reuniões secretas, em que começa a freqüentar com sua namorada Lúcia Helena, aluna do curso de Letras. Secundarista do Caetano de Campos, Beto começa a freqüentar a Filosofia na Maria Antônia e se vê envolvido com o movimento estudantil, o que acaba interferindo em sua vida particular, fazendo-o perder o interesse pela escola, pelo trabalho e pela sua vida sentimental com a namorada. Neste ínterim surge Fernanda, moça de idéias revolucionárias, que resolve perseguir o DOPS (polícia da época). 1964 foi marcado pela abertura as organizações sociais em que estudantes, organizações populares e trabalhadores ganharam espaço, causando a preocupação das classes conservadoras.

Os ambientes da narrativa são vários. Inicialmente Beto mora com um amigo, Batata, em uma academia de ginástica. Funcionário em um banco, logo descobre que a cidade grande também existe disparidades, autoritarismos e rotinas. Depois ao ir morar numa pensão, conhece Valentim, jovem revolucionário, com uma concepção partidária referente à humanidade. Para ele a humanidade se divide em exploradores e explorados, burgueses e não-burgueses, uma visão marxista num contexto de confronto corpo a corpo com o CCC (Comando de Caça aos Comunistas), o das passeatas de protesto regadas a palavras de ordem. Desde 67, o movimento estudantil tornou-se a principal forma de oposição ao regime militar. Nos primeiros meses de 68, várias manifestações tinham sido reprimidas com violência. O movimento estudantil manifestava-se não apenas contra a ditadura, mas também à política educacional do governo, que revelava uma tendência à privatização.

Para Beto, a participação no movimento estudantil é a maneira de se integrar no novo meio. Para isso é preciso ser reconhecido, aceito pelo grupo e acima de tudo, manter-se atualizado. As conseqüências para ele não são favoráveis. Por outro lado, assusta-se com o movimento ao constatar que a luta política estava acima da vida pessoal, e o poder, era o objetivo de todos. Seu engajamento político provoca conflitos interiores, tornando-o radical e apenas interessado no que diz respeito ao movimento, esquecendo suas responsabilidades. O resultado é a sua demissão do banco.

O cursinho do Grêmio representa para Beto, sua grande chance de trabalho. Lá ele passa a trabalhar na Apostilaria e resolve então repensar a sua vida. A perplexidade se dá ao descobrir que muitas das vítimas da repressão faziam parte dessa juventude à procura de rumo. A descrença política fazia com que os jovens se sentissem enclausurado e estrangeiro no próprio país. Já conscientizado, reata seu namoro com Lúcia Helena, tornando a sua vida novamente com sentido.

A Hora da Luta é uma obra que remete o leitor a uma época bastante conturbada da história do Brasil. Álvares Cardoso de Melo expõe de forma objetiva e clara, um período marcado por violência e perseguições políticas, abuso de poder, torturas e mortes. Muitos foram as vítimas que acreditaram estar vivendo num momento propício para a luta. E o resultado foi o fim da ditadura e abertura da democracia, dando oportunidade ao povo decidir, através do voto direto, o presidente do Brasil. No dia 26 de junho de 1968, cerca de cem mil pessoas ocuparam as ruas do centro do Rio de Janeiro e realizaram o mais importante protesto contra a ditadura militar até então. A manifestação, iniciada a partir de um ato político na Cinelândia, pretendia cobrar uma postura do governo frente aos problemas estudantis e, ao mesmo tempo, refletia o descontentamento crescente com o governo; dela participaram também intelectuais, artistas, padres e grande número de mães.

ginaldo
Enviado por ginaldo em 08/06/2009
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