“O Leitor” (The Reader )

“O Leitor” (The Reader )

Qual a moral da história? Bruno Ganz , na pele de um professor de direito, irá dizer que o que escreve os destinos de uma sociedade não é a sua moral, mas suas leis. Ele irá dizer isso para o estudante Michael Berg, interpretado por David Kross. Bom, essa é linha mestra das leis dos homens muito embora, com relação a Outra Lei, pode-se passar incólume pelo júri dos homens, pois ela não tem pressa. Mas é infalível.

A primeira mulher na vida de Michael é Kate Winslet . Veja só.

Ele estava com 15 para 16 anos. Dois palitos e ele se cura da escarlatina, torna-se um goleador e vai proferir as 3 perguntas que em algum momento devem ser feitas. Tolice repeti-las em demasia, não proferi-las significa a perda de uma das mais interessantes fatias da vida. Ele fez as perguntas: eu tenho alguma importância para você? Você me ama? Você me perdoa?

Na pequena Neustad, Alemanha Ocidental, em 1958, por incrível que pareça não existia Youtube, DVD e Karaokê. Então ele arranjou uma ouvinte. Assim, além de um amante estava também se tornando um leitor e, para sua sorte, ela gostava dos clássicos gregos. Posso te garantir que se ela gostasse das crônicas de Belzebu, ele leria com igual afinco.

Parte da história está situada em 58, outra em 95. David Kross fez o personagem Michael que conheceu e amou perdidamente Hanna (Kate Winslet). Ralph Fiennes viveu o papel do Michael que lembra de Hanna enquanto fêmea, mas ao se encontrar com ela 30 anos depois fará a única pergunta imperdoável. Justamente ele. Parte da história se move entre 66, 76, 88, até chegar em 1995. Laborioso roteiro de David Hare, baseado em livro de Bernhard Schlink .

“Não tenho medo de nada. Quanto mais eu sofro, mais eu amo. O perigo só fará crescer o meu amor. Ele o afiará, perderá o preconceito. Você deixará a vida ainda mais bonita do que quando entrou. O céu a levará de volta, olhará para você e dirá: somente uma coisa pode nos completar. E esta coisa é o amor”.

Essas palavras devem ter embevecido os leitores de Bernhard Schlink, assim como a paisagem mostrada por Stephen Daldry , diretor do filme, refrescam as vistas dos espectadores. Um filme romântico...Michael lê isso para ela, lê também quadrinhos de Hergé

e novelas americanas. Chegará o dia em que ela exigirá a leitura antes do amor.

Mas as dicas vão sendo deixadas no decurso. Que idade tem Hanna? O suficiente para ter feito o seu papel durante o apogeu e queda do nazismo, sem dúvida.

A estrutura narrativa, quando não lança questões, propõe armadilhas prosaicas, como a bela Sophie, colega de classe de Michael, o único da turma que não se enturmava e que no final da aula fugia para a leitura entre lençóis.

Hanna engraxava sapatos nas horas vagas, trabalhava como cobradora de bonde e tinha idade para ser mãe dele.

Michael irá sofrer com o desaparecimento dela.

Kate Winslet merece que inventem uma palavra em sua homenagem, que valha por 1000 imagens. Impressionante os mil semblantes que ela oferece durante os sinuosos caminhos de “O Leitor”. Faturou o Oscar de Melhor Atriz e o Globo de Ouro de Melhor Atriz Coadjuvante (isso não parece um contra senso?).

Como as lagartas ocultam borboletas, o inocente filme romance acaba por trazer um debate lúcido sobre os funcionários públicos do totalitarismo germânico durante o Terceiro Reich. Não se trata de uma escavação minuciosa e cansativa. Trata-se de uma abordagem. Hanna trabalhava na Siemens, e viu uma oportunidade de subir na vida “preenchendo um formulário” para a SS. Foi aprovada e mandada laborar em Auschwuitz.

Stephen Daldry saiu do teatro para receber indicações ao Oscar. Ficou famoso da noite para dia e neste levou um. Dirigiu “As Horas” e “Billy Elliot”. Nicole Kidman fora cotada para o papel, mas o espectador lucrou imensamente com a aura intrigante da Hanna vivida por Kate Winslet, cujos olhares para as crianças, para os pratos na mesa e para a realidade que a cerca deixam uma caligrafia ínfima pairando em todos os momentos.

Em 1966 a cidade de Heidelberg sediou o julgamento desses funcionários. Um julgamento aberto para o público, o que incluía estudantes de direito, dentre os quais o jovem Michael. Qual não foi a surpresa dele ao ver sentada no banco dos réus sua primeira amante. Outra surpresa logo em seguida: ele é o único a saber que o buraco é mais embaixo, ou, se preferir, de sua relativa inocência. Com isso estamos com uma hora e vírgula de filme. Ainda tem chão. Somente no final você sentirá a singular moral da história.

Bernard Gontier
Enviado por Bernard Gontier em 26/05/2009
Reeditado em 14/04/2013
Código do texto: T1615574
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