PALAVRA NUA
Versos nus
Essa dor intensa
A saudade imensa
Essa hora densa
Dessa benquerença
O aperto no peito
O olhar sem jeito
O vazio do leito
O querer perfeito
Coração aberto
Sentido certo
Lugar mais perto
Longo deserto
Mais que pensamento
Ultrapassa o tempo
Somente um momento
Desse movimento
Chegada a hora
Partir agora
Não mais outrora
A alegre aurora
Adeus...
12/06/2009
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Palavra Despida
É noite. Ainda intrigada com a não compreensão das premissas acerca de versos livres, se é que tais premissas existam, a priori, resolve dispor em papel, eis que a máquina já estava desligada, palavras que há algum tempo rondavam, como fantasmas.
Resolve expressar de maneira concreta o exercício, na forma de resumido poema, então tem um gesto instintivo, levando a mão sobre o peito, dando-se conta e ao mesmo tempo não compreendendo essa dor intensa aparentemente sem razão plausível.
Algo lhe diz que a expressão traz no seu âmago a saudade imensa que transforma os instantes em que os elementos vêm à superfície, nessa hora densa, igualmente aflorados inconscientemente no terreno onde algum dia fora plantado um jardim com flores dessa benquerença, ocorrida num pretérito quando todos os sonhos pareciam factíveis de serem realizados pela força e poder de uma juventude – eterna – como sentida na época.
Detém-se na sondagem, o intuito é perscrutar o aperto no peito, percebe na sua raiz a imagem d’o olhar sem jeito diante do cenário eloqüente, o vazio do leito - um desencontro entre amantes, pulsando em compassos desiguais, viajantes de tempos distintos, um na freqüência da compaixão, outro com o querer perfeito como diapasão dos seus motivos. Tal desconcerto refletiu a dificuldade bilateral no campo das relações múltiplas, uma visão unilateral de mundo, romântica e ingênua, e no que diz respeito à interação amorosa, uma concepção pueril, tradicional e idealizada, que nos remete ao conto de fadas da Cinderela.
A decisão de seguir em frente mostra o coração aberto, a procura de um novo rumo, o comando do leme deste navio, para um mar desconhecido e novo, na convicção de possuir o sentido certo, mas eis que se dá inusitada descoberta: o lugar mais perto não é o oásis com sombra refrescante e água boa, uma árvore para recostar e descansar antes de prosseguir o caminho, pois se depara com o longo deserto, não com a terra árida e cheia de areia como a do Saara, mas o longo deserto que traz dentro de si.
Um olhar para o interior leva a concluir, que tal encismamento ultrapassa o tempo, assim como as fronteiras de qualquer raciocínio lógico, transcende noções de objetividade, é mais que pensamento, contudo, paradoxalmente, delineia-se na consciência, ser, o estado, somente um momento fugaz, passageiro e indelével, desse movimento, que se capturado fosse, descreveria a metáfora de uma realidade dinâmica, temporal e espacial, fadada a evoluir de maneira subjetiva e imprevisível, pois o ser humano, criado para ser feliz, permanece numa condição de sofrimento como num estágio de aprendizado, e mais do que o necessário, se acometido por algum tipo de patologia.
Reforça as palavras ditas acima os últimos versos do poemeto despido de adornos. Inconscientemente, encerra os conceitos de fim e início. Marca o tempo presente, chegada a hora, indica uma tomada de posição, um impulso de levantar e partir agora, deixando para trás o passado irremediável, uma instância em que as coisas foram postas, e o que foi, está acabado – não mais outrora – sela, definitivamente? o rompimento com o imaginário da fantasia e do encantamento vivido, vislumbrando o porvir ante a possibilidade (ou certeza) d’a alegre aurora.
Este final remete, no olhar mais apurado, que apesar da dor que perpassa todo o poema, existe uma equivalência entre o que foi vivido e o que virá, no final das contas nem tudo foi sofrimento, pois o vate ao mesmo tempo em que se despede da alegre aurora também a vislumbra no horizonte.
12/06/2009