Eco

Morri e me esqueci de ir embora, foi o que pareceu.Meu corpo nunca foi tão chumbo.

Me atrevo pelos cômodos, cansado de não sei. Me pesando, talvez descobrisse que estou vapor de menos vida que ontem, como se o que me contém, sumisse existindo. Uma dualidade, ora materia, ora vácuo. E mesmo assim meu corpo se faz assustadoramente preso as cores, preso ao futuro.

Achei que a música poderia me salvar, os livros, as histórias, as pessoas.

Lembrei de João Bosco contando; tocou uma melodia, compôs como se fosse nova, música que, na verdade, viria a ser "Sinceridad", de Gaston Pérez

" Lá pelas duas da manhã, dedilhava de leve o violão, compondo uma nova música. Nisso batem à porta, ele vai atender, e é um vizinho do mesmo andar, que lhe explica – 'desculpe bater a essa hora, mas é que ia passando e te ouvi tocando essa

música, que fez grande sucesso na minha infância...' E com isso João se tornou ciente de que compunha uma melodia que já tinha sido composta, da qual ele se lembrava toda, e de uma letra da qual não se recordava."

Será que sou assim como nessa estória, uma canção já composta, esquecida e refeita. Estou vivendo quem, se não eu?

Quais erros eu vou recometendo achando ser novos? É mistério. A psicanálise me diz que a resposta está no simbólico. Como música escondida numa camada fina de inconsciente, reproduzida e ecoante, do que faz, e pensa e age sem dar por isso.