bem assim quase não pensando

Queria logo deixar de querer, abandonar o prolongar imenso, o descabelar-se, a coisa que para na garganta e fica. E no fim nada alcança ou chega perto, nada consegue com exatidão dizer o que é mesmo, nem que se explique, disseque, se faça música, escreva, diga, disserte, grite.

Sina idiota, complicadíssima, poeira de nada, fumaça. É pior ainda quando demora pra se esgotar, pedaços de tempo gigantes que mais são uma vida inteira, brasas assopram pequenas, devagar, vulcânicas. Terminações nervosas, neurônios, órgãos, tecidos, tudo, tudo, tudo uma coisa só: Desejo. Uma malograda tarefa, ingrata, de não desejar nem pro pior inimigo, mas maravilhosa, maravilhosa.

Repito aos sussurros pra mim mesmo, digo que o tempo é soberano, o tempo é soberano, o tempo é soberano, mentindo. Me arrependendo.

Não era pra estar nisso, estar assim de um jeito tão não sútil, de amar de uma forma nada calculada, dramática, ser o contrário do que eu gosto de ser, do que eu acho que sou.

O samba único, cantado chorando, o tempo pequeníssimo de regenerar, a proximidade confundida, a dor adiada, o pensamento estancado, penso em nunca sentir fome, penso que o melhor é te esquecer.

A natureza, as coisas e as palavras, podem até se dobrar a semelhança humana, ser máquina, mas o amor não, o amor nunca.

Esse se escolhe sem pedir, rebelde, independente, quieto, musical, brilhante, de abrir o peito e parar a luz. É a oração "salve, rainha", é uma jura eterna e sagrada ao pé do ouvido, a náusea dos princípios varridos do chão pro fim, pés e mãos loucamente beijados, uma razão intranquila, o amor, o amor, que sim, que se eu escrever bem de verdade, bem rápido, de dentro, bem assim quase não pensando, talvez, talvez, talvez até se escute.

"Adeus, adeus, adeus...

Palavra que faz chorar

Adeus, adeus, adeus...

Não há quem possa suportar

Adeus é bem triste

Que não se resiste

Ninguém, jamais,

Com adeus pode viver em paz

(Foi o último adeus...)

Pra que foste embora?

Por ti tudo chora!

Sem teu amor

Esta vida não tem mais valor

(Foi o último adeus...)"

(Adeus, composição de Ismael Silva)