Fragmentados - Capturadores

Numa tarde qualquer...

"Somos nós os possuidores do tempo, ou será ele quem nos possui?" Perguntou-me. Não soube o que lhe responder. Passei o resto da tarde pensando em como as engrenagens que movimentam a vida são singelas e peculiares. Basta que o vento sopre para que uma folha desprenda-se de seu galho, fazendo com que eu repare o caminho. Olho para frente, reflito sobre a folha, entre a estrada e a calçada, decidindo por sujar as solas do sapato nos frutos caídos de Jambolão. Cruzo a esquina, transpassando uma desconhecida... Com ela troco curiosos olhares. E nos segundos seguintes, vejo virar-me para trás e ver partir as costas de alguém que jamais lembrará meu rosto. Este instante, carregado de pequenos acontecimentos, toca-me profundamente. Sim, foi a emoção de capturar o presente que me capturou.

Alguns dias depois...

"São nossos estes sentimentos arrebatadores que junto de nossas façanhas arrebentam-nos em igual (ou maior) proporção? Por amor a eles que dedicamos palavras ao invisível?" Quis perguntar-lhe, e no entanto, silenciei. Segui pensando... Capturadores, todos nós capturados. Diversas vezes peguei-me trôpega, tentando equilibrar-me nesse tecido que veste-me chamado Vida. Eu, tecida dessa teia de aranha cósmica de dimensões incognoscíveis. Dançando nela as emoções que me afligem em todas as extremidades possíveis do meu corpo. Frenética flor de melancolia, num ritmo louco contagiante. Guardo também uma extensa porção de gemidos e espanto nestes cantos. Mas são sempre os teus sussurros que me chegam enquanto eu grito de um lugar muito, muito distante. Capturada por este imenso espaço silencioso - entre nós.