Na contramão do mundo

É na contramão do mundo que dou meu pontapé na vida

enterrando as convenções e tudo que a orbita

faço na realidade e no sonho, um favor àqueles que conhecem a fatalidade

de tudo que é reto e milimetricamente encaixado

no sistema hermético que encadeia a morte prematura do pobre alienado

Enquanto a pressa ganha as massas, e desatina rotinas destinadas ao trabalho árduo

estou seguro na calmaria viva de uma maré redentora da escrita

vagando pelo mar vago de vagas literárias

no contraste dolor e incolor de um mundo árido que não dispõe de tempo para contemplações

não me recordo do dia em que pertencia à manada trágica do cortejo fúnebre da existência

que não sabe de onde veio nem para onde vai. Não julgo, pois sei menos ainda

mas ainda estou em vantagem: sei o suficiente para dizer que pouco sei dos mistérios

por eles negligenciados, e por mim, afoitos para serem desvendados

Para eles, já é inútil imaginar mundos e dar voz aos medos e astúcias

olham-se no espelho, sem nada ver além de uma superfície refletora ou um narciso repressor

aos poucos vão desconhecendo o que alma pede e o que o coração precisa, isso se já não tiverem sido suprimidos

desaprendendo o desabrochar descompassado do deserto desejoso

visto como desajeitado por aqueles que não encontraram o âmago da vida nas artes cruciais ou na eternidade da folha em branco aberta no seu latifúndio de visão

Enquanto os poucos que restam, escrevem poemas de herança estética e formas perfeitas

me refugio na imperfeição dos dias e das noites, naquela que sempre me inspira

a não me acorrentar àquilo que me salva da desventura de um viver cheio, mas vazio

Flora Fernweh
Enviado por Flora Fernweh em 02/10/2020
Código do texto: T7077975
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