DIÁRIO DE UM ÁUREO

Águas límpidas e azuis brilham no lago.

Manhã de sol brilhante, campinas verdejantes.

Vento leve, calor ameno, tudo para um belo dia.

Cavalos robustos correndo pelos campos...

Pássaros em debandada, pelos ares límpidos de outono.

Folhas verdes abanando com o vento,

Juliana correndo com Rodrigo atrás dos cisnes elegantes até o lado.

A casa grande fica lá em cima do monte.

Imponente, cheia de vida e com muitas palmeiras imperiais ao seu redor.

Casa lindíssima, muito branca e com as janeladas todas azuis e portas também.

A sinhá, Dona Patrícia, da sacada, fica cozendo com suas mãos as longas toalhas.

Toalhas de estopa, de algodão, de poliéster, com suas exuberantes franjas.

Na cozinha, a tia Firmina e sua filha Gení e minha mãe, Norfa, esquentam o fogão de lenha.

Elas são negras, filhas de escravos, mamãe e titia eram escravas.

Agora, cozinhar melhor do que elas eu não acredito que exista alguém.

Filisbina e Gertrudes ficam na bica lavando roupas.

Lavam roupas todos os dias, na pedra da beira do rio Tibiri.

Elas também ajudam na cozinha escolhendo feijão, milho, arroz e mandioca.

Nos cafezais, todos trabalham, todos ganham um pouquinho.

Pois já não somos mais escravos, somos livres e considerados “gente”.

Eu e meus amiguinhos brincamos o dia inteiro.

Ainda não brincamos com os filhos dos brancos,

mas acredito que um dia isso vai acontecer.

Não porque os branquinhos não querem, mas porque o grandões branquelos proíbem.

Os grandes e descascados já conversam com a gente e até dão balas.

São brancos, mas não são ricos.

E dão balas gostosas do armazém do seu Anacleto, um italiano mão-de-vaca.

Papai se chama Leôncio e é negro, filho de escravos. Ele já é áureo.

Somos em 7 irmãos. Os mais velhos já vão para o cafezal com papai.

A fazenda do Senhor Pedro Gonçalves de Oliveira é muito bonita!

Seu Gonçalves é bom, mas parece que ser rico traz muita tristeza,

Pois seu Gonçalves nunca sorri e seus filhos são muito rebeldes e brutos.

O capataz da fazenda e o capanga já morreram, agora só tem o guarda e é muito bom.

Assim, eu vou crescendo aqui nesta fazenda, mas sei que em outras fazendas não é assim.

E eu fico muito triste em saber que os meus irmãozinhos negros, não são tratados como eu sou.

Eu fico muito triste com isso. Gostaria que todos os fazendeiros fossem como seu Gonçalves.

Desse liberdade e pagasse para trabalhar no cafezal.

A lei Áurea é muito recente, e alguns fazendeiros tratam os negros do mesmo jeito do tempo da escravidão ainda.

Fazenda Asa Branca, fazenda que da escravidão entrou na liberdade.

Entre os negros e os migrantes italianos, todos vivem aqui buscando vida melhor aqui.

Nós crianças, negros e russos vivemos brincando, mas não juntos, os italianos adultos são chatos.

Eles ainda não acreditam que somos como eles, mas somos.

Um dia, haverá um outono mais bonito do que esse e aí todos viverão juntos.

Um dia, haverá novas planícies e novos lagos, brancos e negros nadarão juntos.

Haverá justiça, amor e paz em cada coração. Seja branco, negro, mulato ou não.

É isso aí!

Acácio Nunes

Acácio Nunes
Enviado por Acácio Nunes em 16/08/2018
Código do texto: T6420640
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