A vaca leiteira pasta na manga fronteira ao curral. Lambe o sal, sacode a cauda e muge chamando a cria.  Novo dia se levanta no vaivém do nascer e pôr do sol. Meio baiano, meio mineiro, Manuel Justino Batista  Generoso  não esperava que o  galo  cantasse e levantasse outro galo o mesmo canto noutro terreiro. Poeta inventado de ser fazendeiro  parava encantado, e se encantava em uma poça d’água, apreciando uma borboleta auriverde,  que bate asas; faz que vai,  que vem, volteia e pousa no dedo. Em sua rotina diária consumia pedaço de sol minguado cedo, e à tardinha; assentado na barriga de uma raiz que bebe no córrego. Horas a fio ficava olhando lambaris que deslizavam, escorrendo luz prateada em suas escamas, e perguntava interessado na resposta: Por que a beleza das cores é tão passageira? Por que a borboleta vive tão pouco? Mal sai do casulo, e meses depois,  evapora, entrega seu espírito de borboleta ao Criador e se vai. A vida se esvai. Parece que a criatura tem natureza artificialmente postiça. Tudo descora lentamente e a cor da gente desaparece com os raios do último sol.

O fazendeiro volteou o curral antes do sol;  mandou Onofre afrouxar a mão nas tetas da vaca e ser mais pródigo com a cria. Mimosa estava fraca, carecia de suplemento. Foi minguando o leite, minguando... Até que apareceu no pátio sem o bezerro. Naquele dia, Generoso  mandou rastrear qualquer sinal felino de grande porte, uma pegada, uma carcaça de presa, o que fosse. Levasse os dias que levasse. Varresse tudo, do grotão de Campo Grande, até o cerrado de Sete Passagens. Assuntasse qualquer rabeira ou vestígio de animal selvagem por ali. E se encontrasse onça, trouxesse a lembrança do couro amarrado na sela. 
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Adalberto Lima - trecho de Estrada sem fim...
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