Ser Mãe

A noite já vai alta e a madrugada brevemente chegará… Silêncio absoluto!

Estou aninhada, no velhinho sofá, coberta com minha mantinha azul, bem quentinha… Deveria estar relaxada, em paz, mas não, não estou. Estou inquieta, e a Inquietude é o meu ADN… Meus olhos não fecham, continuam bem abertos, e eu sem sono estou bem acordada. Não consigo adormecer. Aconchego-me mais, como que a convidar o meu corpo e a minha mente a relaxar. Fecho os meus olhos, cerro-os com força, e tento mantê-los fechados. Várias espirais de cores diversas, se fazem notar, e eu gosto do que vejo, mas de um momento para o outro, a minha mente parece uma fita de cinema, onde memórias, palavras escuras e diversas, assim como pensamentos desagradáveis, desfilam em catadupa.

Sinto-me vestida de tristeza, descontentamento, angústia … Sinto-me malograda pela vida, mas mais pelas pessoas, aquelas que se dizem família, a de sangue… Serão familia, ou parente? … Descontente estou, decepcionada também, e do que vejo e lembro, concluo que é melhor conviver com animal do que com gente… Ah, mas para quê tanta consumição? Não leva a nada, e só dá conta do meu pobre e cansado coração… Mas sou assim …Difícil será mudar. Tenho sempre de o porquê de tudo tentar encontrar, acabando na maior parte das vezes, a ficar de mãos a abanar… Nem tudo tem porquês, nem tudo temos de saber, penso eu…Mas há coisas que remédio não têm, porque já remediadas estão… Por isso tenho, de uma vez por todas de aprender, que existe gente que não nasceu nem sabe ser mãe, porque não se sabe entregar por inteiro e de coração…Para se ser mãe, alguém disse um dia “ Ser mãe é assumir perante Deus o dom da criação, da doação e do amor incondicional. Ser mãe é encarnar a divindade na Terra.” ( autor desconhecido) … Mas algumas são pessoas faceiras, jogam para o lado que lhes convém, como se lidassem com as peças de um tabuleiro de xadrez, e quando damos conta, estamos jogadas a um canto outra vez… Porquê? Porquê assim? Não tem porquê, porque sempre foi assim, talvez por minha culpa, pois já deveria ter posto um fim… Ausência, separação, longe da vista e do coração, veio o pedido de desculpa, perdão, voltar a dar a mão, e de nada lhes valeu a lição… Não quero ninguém mudar, quero é crer que as pessoas podem e conseguem com amor verdadeiro melhorar, nas suas palavras e nas suas ações … Não deitarem palavras ocas, vazias da boca para fora, sem sentimento algum, nem realizarem ações hipócritas, pois isso só vai infestar o que as rodeia, tornando o lugar ou momento num mal-estar. Mas, porque há sempre um mas, para algumas creio já não haver nada a fazer… São assim, matéria corrompida, e se não mudaram neste agora, nunca agora irá acontecer…

Porque seus olhos nunca me viram, como deveriam ter visto, seu coração nunca valorizou, ou valorizará minhas palavras, gestos ou ações que tive sempre para lhe oferecer… Sua boca, nunca me disse, ou dirá o que eu gostaria de ouvir, para verdadeiramente sentir… Seus braços nunca dentro de um abraço com AMOR sentido, verdadeiro, me hão-de serenar, aliviar, regozijar e acima de tudo AMAR… Seu abraço para mim, será sempre um abraço solto e a fugir, sem contacto físico quase sentir… No fundo nunca me soube, nem há-de saber SENTIR … Creio que o tempo, a idade, pouca ou nenhuma sabedoria acerca do amor de mãe, que é verdadeiro, e igual para todas as filhas que tem lhe ensinou ou deu … O que tem em si é só, futilidade, seu ego em alto, e a mania de que é perfeita, justa e verdadeira, quando na verdade é a maior asneira, e a maior desfeita…Porque ser mãe é AMAR por igual, ter seu AMOR incondicional por todas… Porque todas, nasceram do ventre dela… Eu, há muito pensava ter guardado a cadeado, no sótão do meu guerreiro coração, a mágoa do todo que me haviam feito… Perdão pedido, e meu PERDÃO foi Oferecido de coração, claro que o esquecimento não, porque eu não sofro de amnésia, esse esteve sempre escondido, mas presente, e mais presente ainda, quando a campainha dava sinal de que estávamos a voltar ao passado, mas eu dava sempre outra oportunidade, de corrigir, agir melhor… Fiz tudo o que pude e soube e sempre pelo bem, pelo AMOR que em mim tinha … Hoje, esse amor tornou-se desvanecido, porque amei melhor do que me amaram a mim até hoje. Dei de coração afectos que não recebi, mas sim fui inteira, verdadeira, fui Eu como sempre sou na entrega ao outro, e assim continuarei a ser…

Continuarei a seguir meu caminho, com a certeza de que tentei, tentei com amor e por amor, apesar de mais uma vez ter falhado, não por mim, mas pelo outro lado, aquele lado que deveria de ser um Amor Incondicional, mas não o é. Dei tudo o que pude dar tanto de mim, como dos meus, mas como digo mais uma vez de nada valeu…Voltar a tentar? … Tentar, palavra que por mim vai ser rasurada, sei que nunca se pode dizer nunca, mas também sei que existem exceções, esta é a minha, porque não existe o tentar, quando não há ligação, pode haver a de sangue, mas não há a do coração, e esta ultima é a mais importante. Se me voltar a chamar, não irei, não vou ceder, farei por não ouvir, nem sequer ver. Se voltar a pedir para tentar, perguntarei “ Tentar? “ e num esgar de sorriso, dir-lhe-ei que o TENTAR foi rasurado nas páginas da minha vida, que a vida é mais do que tentar é aceitar o que não se pode ter ou haver, quando não há ligação, nem sequer laços de coração … Terminarei por ali, sem mais nada a dizer, ou fazer, simplesmente seguir em frente e esquecer, e já que o não tive, esse Amor Incondicional de mãe, que seja eu um presente quase perfeito nesse AMOR para meu filho, e que ele nunca me possa acusar de falta de abraços apertados e perfumados de AMOR, beijos sentidos em suas bochechas de bebe, menino/homem, de palavras carinhosas… No fundo, que eu seja a mãe, que eu queria ter tido, não perfeita, mas que me aprimore a cada momento, ser verdadeira no sentido lato da palavra… Mostrar ao meu filho que o meu AMOR por ele é INFINITO, porque meu coração não tem limite para o amor que eu sinto e tenho por ele … Quanta gratidão, poder ser mãe, a maternidade é uma dádiva dada por Deus, e para mim ser mãe é descobrir diferentes formas de amar, é a melhor coisa do mundo, é um AMOR que não acaba nunca, e por vezes o coração dói-me de tanto AMOR que sinto por meu filho… Ser mãe é ser Vida … Que eu seja assim, e esqueça a mãe que tive para mim … Não vivem os órfãos sem pai e mãe? Porque serei eu diferente, não são eles também gente? Claro que sim, a única diferença é que a mãe deles “partiu”, e a minha da minha vida sempre “fugiu” … Há que aceitar, nada a obrigar, porque quando se ama, não se obriga, liberta-se … Agora, desabafo escrito, sinto que estou leve, e que meu ADN agora é imperturbabilidade… Estou cansada de corpo, não de espirito… Posso agora repousar em paz. Mente liberta, coração assente, e meus olhos e corpo, estão prontos a repousar, a mergulhar no sono… Deito-me para baixo, esticando-me sobre o velhinho sofá, e cubro-me com a mantinha polar. Dirijo uma oração breve a Jesus de gratidão, no silêncio absoluto que invade a pequena salinha da entrada, pois sei que Ele sempre me ampara, me reconforta no Seu divino colo… E adormeço leve, serena e imperturbável, ao Som do Silêncio que me rodeia acreditando que viverei e serei feliz, assim, na minha nova condição de órfã de pai e "mãe" agora…

Nada demais, só aprendizado…

Maria Irene
Enviado por Maria Irene em 28/02/2016
Reeditado em 16/06/2016
Código do texto: T5558149
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