Vendetta

Era deslumbrante aquela paisagem, composta por um conjunto de montanhas arenosas, com poucas árvores e algumas casas espalhadas pelo cenário aonde era possível imaginar a felicidade dos residentes.

Sentindo a brisa atacar meu rosto, fechei os olhos e por alguns segundos tive a sensação de estar em outro tempo, outra realidade, diferente daquela amargura que vivia ultimamente.

Ao abrir os olhos e ir de encontro ao meu carro, não pude deixar de pegar um panfleto do novo empreendimento imobiliário da região: "Viva nas montanhas", quem sabe um dia, pensei quase que em uma pequena prece, quem sabe...

Entre uma curva e outra na estrada, os pensamentos floreavam a minha mente e passei a viajar nas minhas idéias, consubstanciadas nos momentos vividos nos últimos anos.

Estava certo, ainda mais depois do ocorrido, que quando escolhemos alguém para namorar, para casar, para ser um companheiro de vida, pressupõe-se além do romance, amor e sexo, a lealdade como o elemento fundamental de uma relação amorosa.

Contudo, ao descobrir que a lealdade imaginada jamais existiu, após a fúria, fica consolidado um sentimento de tentar compreender os erros cometidos durante o relacionamento.

Fato é que sexo é para qualquer um, amar para alguns, mas lealdade é para poucos. Ser verdadeiro com o seu cônjuge, ainda mais nos dias de hoje, é tarefa quase impossível.

Compreendia isso naquele instante, conseguia entender claramente que muitas pessoas não eram verdadeiras com elas mesmas, como poderiam ser com os seus companheiros?

Desse modo, entendia melhor a amargura na minha vida, conseguindo controlar a depressão pela perda de uma pessoa querida no meu pequeno mundo, buscando, portanto, uma oportunidade de recomeçar, fazer valer a experiência adquirida e conseguir viver razoavelmente bem com os meus traumas do passado.

Foi uma longa viagem...

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Dirigindo já há algumas horas, consigo perceber um cheiro peculiar no carro, uma mistura de terra, suor e sangue, um odor que certamente jamais esquecerei.

Despeço-me do meu carro e dos infelizes feridos e desacordados dentro dele. Solto o freio de mão e empurro vagarosamente o veículo em direção ao precipício com mais de 800 metros de altura.

Ouço o carro bater na rocha e uma pequena explosão.

Respiro fundo, dou as costas ao precipício e com um pequeno sorriso no rosto penso: Montanhas, ai vou eu!

Acordei! Acordei?