A TERRA DOS SEM QUEIJO

Na plantação do senhor Leitão não tem feijão, não se colhe trigo, não se planta aipim.

Senhor Cabrito já anda aflito, dona Cabra não tem leite pra alimentar os cabritinhos. Dona galinha não põe ovos porque não come bem e o que tem guarda pros pintinhos coitadinhos, tão fraquinhos! Olha lá o seu Zebu, de tão fraco perdeu a pose, vive cabisbaixo com cara de urubu. E o senhor Cachorro coitado vive triste acabrunhado sem força pra latir.

Leitão, cabra, cabrito, Galinha, vaca, periquito, bicharada reunida sem saber qual a saída de um povo pobre e sofrido que não planta, não produz, por causa de um tal rei Eurrico que só compra queijo lá fora e pra pagar a conta do queijo vende a terra da bicharada que não consegue plantar nada, pois falta dinheiro e semente, falta saúde praquela gente que só vê fome e tristeza e diante de tal pobreza esquece até de sorrir.

Ah que feio rei Eurrico, vender as terras do povo só pelo queijo importado! Mas eis que uma luz se acende...

Reunidos na fazenda, decidem por mudar a própria sorte: senhor Leitão, seu Cabrito, dona Cabra, seu Zebu dona Galinha e o seu Cachorro, até o Pato e dona Patinha, dona Vaca também foi. Amigos estamos aqui, dizia o Leitão afoito, pra vencer esta batalha e ver o Rei tremer diante da corte! Isso mesmo, disse o Cabrito, todos juntos seremos fortes! Isso mesmo, disse o leitão, vamos botar pra quebrar! Levaremos as enxadas para o palácio arrebentar!

No horário combinado, partia a bicharada unida.

Na praça em frente ao paço real, alguém viu a bagunça e quis saber o que era. Mais de perto percebeu não ser bagunça aquilo e sim uma passeata de trabalhadores talvez...?

O frei que amava o povo e solidário que era logo ficou animado e sorrindo gritou: irei à luta com o povo!

Bom dia pessoal! Posso me unir a vocês? E o que o senhor faria? Disse o Leitão, num certo tom de ironia. Posso ser útil amigo, além de rezar missa, uso a força da palavra na luta por justiça.

Venha comigo parceiro, vamos nessa! De justiça nós precisamos e se sua palavra é forte vai mudar a nossa sorte e o Rei entrará pelo cano!

Um momento, disse o Frei. Precisamos ser ousados, porém, muito organizados e na paz vamos vencer. E para ter organização, criaremos um Movimento: o MSQ - Movimento dos Sem Queijo.

Chega de o Rei só comprar queijo estrangeiro pra conseguir dinheiro, enquanto a bicharada toda fica sem terra sem nada. Vivendo escravos da fome!

Prontos todos e animados, a comitiva seguia em frente.

O rei Eurrico avisado, furioso, aguardava a turma de desordeiros. Soldados a postos levaram o maior susto porque em vez de bagunça a turma do Frei Chicão emocionada cantava um lindo e forte refrão: ¨Aqui um novo mundo é possível, se a gente quiser...¨

Que beleza de se ver a união de um povo que só queria de novo, plantar, colher e comer!

O rei Eurrico não estava com jeito de muita conversa, estava sempre com pressa e pensava em viajar outra vez. Então, falou com desdém: vamos, digam a que vieram, pois tempo eu não tenho. Negócios me esperam, devo comprar queijo para a corte. É sobre o queijo Alteza, disse o Cabrito. Precisamos que o senhor nos devolva o direito de plantar. Também queremos recursos e a certeza de ter onde vender todo o queijo que pretendemos fazer. Fundaremos uma cooperativa para os lucros dividir, dessa forma nossa família terá o que comer, e do que sobrar compraremos máquinas para colher. Vejo que estão bem espertos, já falam até em lucros! E de quem é essa ideia da tal cooperativa? Vocês estão malucos? Nasceu entre nós a ideia e não estamos malucos. Disse Chicão sem rodeios: o senhor sim, Alteza, parece perder o juízo, compra queijo lá fora e com isso mata de fome e tira a dignidade de quem trabalha pra viver. Se isso não bastasse, da Terra que não é sua, faz o comércio sempre! A terra não é de ninguém, a terra é Mãe, é farta! Portanto, pare com isso Alteza! Ou terá que abrir mão de todas as regalias, até de andar de avião! Perde o trono, as suas posses, perde a razão e o poder. Vai manter-se de migalhas, poucas de pão, pra sobreviver!

Depois de muita conversa e argumentos bem fortes que o Frei Chicão exaltava, bem que o Rei Eurrico tentava, mas a turma pressionava e ele então se cansou.

Decidiu firmar um contrato com o tal de Movimento. Por certo contrariado, pagou o queijo adiantado, dava gosto de se ver!

Frei Chicão alegre estava, pois a esperança brotava de novo nos olhos do povo, que descobria em si, coragem para lutar por justiça, trabalho, dignidade sem perder a fraternidade.

A turma de novo em passeata louvava a vencida batalha graças à luta de todos e o apoio do Frei, que usou de serenidade e muita força de vontade praquela batalha vencer.

A volta foi só alegria e era tanta gente que vinha com eles comemorar, que a estrada ficou pequena. E foi batucada e canção no retorno da bicharada, que dançando também cantava o lindo refrão da vitória: Se a gente quiser aqui outro mundo é possível!