Da vida que podia ser
As flores afloram em meu jardim
Despertam de seu sono profundo
Eu ouço os pássaros gorjeando
Eu não quero mais existir.
Vejo crianças correndo pela rua
Dançando na chuva
Alegria e inocência bailam
Aos raios de um sol frio
Em dias nublados
Sem cor
Sem vida viva
Só a tristeza sorri
E acena para mim.
Nada me toca
Nada me encanta.
Ondas fortes de memórias mortais
Quebram em minha mente frágil
São dores que não quero lembrar
São momentos a me visitar o coração
E me fazer sangrar
Sem parar.
Já não dá mais para escapar
Os meus muros foram derrubados
As portas foram arrombadas
As janelas foram quebradas.
Minha esperança está a nadar?
No fundo de um oceano perdido
Sem fôlego para respirar?
O vento sopra minhas feridas
Mas não curam
De frente para o mar
Elas ardem,
Como nunca.
Eu tento me levantar
Mas a angústia é a minha âncora
E a mergulhar nessas eternas lembranças
Eu me afogo e me entorpeço
Sem chance de gritar por socorro
Sem chance de ver o meu enterro.
À noite,
O pior filme real de terror
A pior canção de amor
O pior retrato para expor
O fracasso de quem muito sonhou
Acreditou que era real
A ilusão que o incendiou.
Os corvos pousam no peitoril
E por um momento eu sei
Eu sou o que sobrou dos meus sonhos
Uma tentativa sem fim
A encontrar o que se perdeu
Dentro de mim.
De madrugada,
A morte lenta e desesperadora
A apunhalada certeira
Da vida a me tirar
O quase nada
Que me restou de esperança.
Um corpo sem vida
Sem nehuma chama.
A solidão pungente
Nunca me erra
Sempre me encontra
Chorando pelos cantos
Afogado em meu pranto
Sempre me acerta.
É a flecha do anjo da tristeza
Que me fere o peito
É a flecha dos demônios
A me atormentar a vida inteira.
E de repente eu caio
Num lugar sem fundo
Escuro
Não dá para me enxergar.
A lua de longe,
Brilha tão cinzenta
Junta das estrelas esquecidas por nós
No eterno vazio desta existência.
Por horas sinto,
Eu sou o que restou das mágoas
Um sorriso muitas vezes fingido
Para me esconder da dor exposta
Que sempre fui
Como um eterno rio que flui.
E num delírio eu te vejo
Na penumbra que revela o seu rosto
Eu tento te tocar
Mas a imaginação acorda
E eu estou de frente ao espelho.
E desta vez
Eu não tenho dúvida:
Eu sou o que restou de nós
Do futuro, das promessas a se cumprir
De amar, de ser um só
Do desejo de nunca desistir.
Eu sei agora que sou
O silêncio perturbador
Que grita o desespero da dor
De tudo que podia ser
Da vida a se exercer
Com poesia e beleza
Com mais verdade
E menos tristeza.
Da vida que podia ser
Sem a presença iminente
Da morte que me sustenta
E para sempre,
Me acalenta.