Eterno Teatro do Desespero

Sempre tentando me encaixar

Sempre procurando me enquadrar

Eu fui nocauteado em meu âmago

E pus-me a nadar em meu cais.

Por onde quer que eu vá

Há regras, padrões e etiquetas

Para nos engessar

Para nos configurar

Nos retratos do sistema.

Eu fui socado no rosto

E mesmo caído de dor

Prostrado em humilhação

Eu fui chutado

Por ser diferente dos demais.

Mas eu continuo diferente

A violência não é capaz

De mudar a minha essência.

Eu pedi ajuda

Gritei por socorro

O semblante de apatia

E o sorriso da indiferença

Me expulsaram do coração

Da humanidade e da decência.

Corpo aviltado

Reduzido a cor

A classe e a pessoa

Que comigo se deita

Eu fui entregue a negligência.

Sozinho pelas ruas movimentadas

A cidade parecia calma e serena

A minha dor não comovia

Nem minhas lágrimas lhe tocava.

A cidade está totalmente congelada.

As nossas emoções foram programadas

Os pensamentos são cronometrados

Os sentimentos são ditados

As palavras são decoradas

O humano demasiado humano

Está morto e sepultado.

Transformado em pedras

Corações vazios em almas plastificadas

A consciência coisificada

Dá espaço a toda banalidade do mal

Criando monstros diariamente

Que nos devorará tão rapidamente.

Ações impensadas

Gestos calculados

Somos mais do mesmo

Sem um pingo de inteligência.

Somos um vazio

Um todo supérfluo

Eu te descarto e tu me descartas

somos todos produtos de nós mesmos.

E nessa troca de corpos por prazer

Ou puro sofrimento

Damos mais lugar ao medo

A dor de existir

A existência morta

Por todas atitudes enquadradas

Quilometradas todo o tempo.

A vida se tornou algo raro

Os aparelhos nos dominam

E nos conrolam

Vozes robóticas cantam sentimentos

E calam o sofrimento.

E de rancor e ressentimento

Vamos todos morrendo

Como Sísifo carregando sua eterna pedra

Fugindo da Grande Górgona desse Eterno Teatro do Desespero.