Breve prosa sobre o amor (ou a dor)

Parte I

Devagar avanço em direção ao nada. Pois já sem fôlego, sem alento, sem – na verdade – teu alento, não há mais luz capaz de alumiar meus passos incertos, minha incerteza imóvel. Devagar divago deveras desorientada. Duplamente desorientada após tomar conhecimento da tua existência. Passaste por mim correndo, todavia. Triplamente desorientada após tomar conhecimento da tua atual inexistência na minha vida. Mas as ausências que lentamente abriram crateras em meu âmago não mais existirão – há agora tão somente uma, a Ausência fulminante que reina no palácio da alma. Outrora teus retornos construíam pontes áureas – quiçá tocadas por Midas –, que apagavam qualquer vestígio da catástrofe sofrida. O Vazio abissal que habita em mim – trazido pela Ausência – leva-me, contra todas as minhas vontades, à memória de uns olhos serenamente doces e tristes, que carregam toda a angústia capaz de ser carregada. A terna amabilidade daqueles olhos quando fitos nos meus – estes débeis, cansados de sofrer – jamais, nunca, em hipótese alguma se apagarão. Nem no fim do meu futuro. Eu vivo pelos teus olhos.

Parte II

A partir do momento em que o tempo torna sutil e doce a lembrança, serenizando-a, a dor muito se esvaece, mas não o amor. Ele permanece, entretanto o quê de ígneo e novo é amenizado. Tu igualmente permaneces; tua voz fez-se calma no caos das palavras; teu abraço tornou-se uma brisa outonal que toca meu corpo; teus olhos que por mim lindamente choraram são agora estrelas longínquas.

“Meu Deus! Um momento de felicidade! Sim! Não será isso o bastante para preencher uma vida?” Ambos sabemos que é o suficiente. Para mim foi.

11/06/14