Noite tão rasa, já é dia. Chaves na mão, chocalhos, capacete, minhas vestes de fantasia, meu gibão. Hora de enfrentar os perigos da mata. Bichos esquisitos, minhas armadilhas matutinas. Solavancos na montaria; esforço-me para não cair. Uma dor me aparece e desaparece, aqui e ali. Mesmo sem perceber o espinheiro, sinto o alfinetar de cada espinho. Garranchos de vento me riscam o rosto. A pressa é o caminho. Em cada trilha cruzada, sigo aboiando. Não existe meio, somente começo e fim. Saio, cantando para mim. Ao redor, uma leva de transeuntes estranhos, sem face, sem nome, sem o lado de dentro. Finjo que não os vejo, para não perder a graça. E solto a voz, sob a luz de holofotes. Caatinga urbana, sol que me queima a casca, lugar rude para se viver. A boiada não tem casa, nem pouso. Somos joões, marias, raimundos, seres solitários, vestidos com armaduras. Somente assim, presos em nossos mundos, enfim, nos sentimos seguros.
Aluísio Azevedo Júnior
Enviado por Aluísio Azevedo Júnior em 03/04/2013
Reeditado em 14/04/2013
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