Idoso aos 25

Estou com dor de cabeça.

Meu estômago não para de se remexer.

Minha bunda coça, a cadeira range

E o céu está azul

Azul pra caralho.

Já estou indo para a segunda semana

De dor nas costas

A qual não me deixa amarrar os cadarços

Ficando de quatro

E também não me deixa levantar da cama

Sem gemer.

Como se mesmo sem dor gemer não fosse algo corriqueiro.

Essas mulheres não calam a matraca um minuto,

Cara!

A pauta é das mais relevantes: emagrecer.

Emagrecer almoçando pastel

Com uma gaveta cheinha de Ana Maria

De chocolate.

Beliscando amendoim o dia inteiro

Bebendo Coca Cola o dia

Inteiro.

E falando

O dia inteiro.

Minhas olheiras me dão um aspecto de miséria

A parte branca dos meus olhos está vermelha

E meu cabelo só não é o mais feio do mundo

Porque há um milhão de cosplays do Neymar

Rodando por aí.

Feíssimos demais...

Cara, eu daria tudo pra estar em cima de um skate agora

Ou então em cima de um sofá

Jogando Donkey Kong 3

Ou Contra II

Ou F-Zero

Cavando diamantes rosas no jogo do Pateta

Coçando o saco debaixo do cobertor

Ouvindo as marretadas do meu tio mecânico

No quintal.

Enrolando a fieira num peão

Cortando a cabecinha do peão

Pintando o peão com lápis aquarela

Daquela caixa de 36 cores que nunca

Pude ter.

Fazendo rabiola

Xingando o estirante

Cavando boxes na terra

Pra jogar bolinha de gude.

Toda essa merda que eu não dava a mínima quando fazia

Toda essa merda que foi soterrada por chips e maçãs mordidas.

Toda essa merda que fiz parte; parte da Geração Viagra.

Dinamite 98, Diário de um Detento, Fogo na Bomba

Tretas de socos na hora da saída do colégio

Enfiar potinhos de Yakult na roda de trás da bicicleta;

Aquela ruiva sardenta que fez meu coração de capacho.

Vagaba.

Rolar com cachorro que arrasta a corrente

Por cima das próprias merdas

Gravar fitas na 89FM

Ficar brincando de esconde-esconde

Passar por baixo da catraca dos ônibus

Roubar latas de spray nos depósitos

E sair por aí, destruindo o patrimônio alheio;

Nadar ao lado de cocôs no Sesc Itaquera

E chutar o rabo do Stone Heart

E voltar pra casa com a boca sangrando

Depois de ter tomado umas porradas dele.

Viado.

É assim que a gente definha

E vai definhando

Sem parar

Segundo a segundo um passo a frente

Indo de encontro à senilidade

E à falta completa de sentido.

De tudo.

Olhando o céu azulzíssimo através de dois palmos de janela aberta

Diante dos dois quilômetros mais onerosos de toda a América Latina

E querendo dormir, dormir, dormir, dormir, dormir e dormir

Completamente idoso aos quase vinte e cinco anos

De idade.

30/01/2012 - 18h00m

Rafael P Abreu
Enviado por Rafael P Abreu em 30/01/2012
Reeditado em 30/01/2012
Código do texto: T3470746
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