005 - O Rio Perdido...

Em meus momentos de desfazer me escondo dentro de um imenso deserto que existe aqui dentro de mim, no alto há sempre uma lua toda cheia, brilhante, a tudo clareando como se dia fosse, extensões imensuráveis de areias se estendem para todas as amplitudes, dunas imensas projetam sombras fantasmagóricas que das vezes em momento descuidado assombram o meu espírito.

Num repente por entre montes de areia um rio destrambelhado escorre na minha direção, abismado pensei que fosse um sonho dentro de outro sonho, mas o rio deslanchava sobre aquele areal e na minha direção espraiava.

O que mais espantava é que as águas daquele rio não infiltravam nas areias do deserto, pelo contrário deslizavam impunemente de maneira organizada, mantendo larguras e profundidades no decorrer do percurso, refletindo no seu dorso toda a beleza da luz do luar, de longe parecia uma imensa serpente prateada ziguezagueando sobre aquele mar de areias.

– Como pode um rio deslizar sobre estas areias e não ser sugado para as profundidades? O que faz este rio tão longe do seu leito?

– Não se assuste, eu sou um rio perdido!

– Um rio perdido? Como assim!

– Vivia eu preso no meu leito, por séculos sonhava em conhecer outros lugares, e a oportunidade a calhar apareceu, quando uma tempestade inundou as nascentes e eu cresci tanto de volume que na primeira curva saltei para fora do meu leito e deslanchei por este areal sem fim, tão sem fim que me perdi, hoje solitário e sem rumo procuro meu antigo leito!

– Neste deserto nunca existiu rios, portando deves mirar outro nascente para que possas seu antigo curso encontrar!

– Já mirei todos os nascentes e nada encontrei a não ser areias e mais areias, você é a primeira pessoa que encontro neste deserto. Que mundo solitário e melancólico é este seu deserto!

– Gosto daqui, aqui me sinto em paz.

– Que paz? Viver escondido de si, esconder da realidade não traz paz alguma, é uma quimera, tudo aqui é falso e irreal. Venha comigo vamos procurar minhas nascentes.

Conversando foram escorregando por longos caminhos até que em um dado momento o rio perdido se estancou:

- Vamos parar aqui, no distante do olhar você avista aquele vale verde, florido, cheio de vida é lá que ficam as minhas nascentes e as suas também.

– Eu só não entendi porque você quis se aventurar por tão longas distancias, fluir por entre um mundo tão diferente do seu!

– Eu sempre desejei conhecer além do meu leito, agora sei que onde eu estava é o melhor lugar do mundo, tinha que provar desta aridez, desta solidão, desta melancolia, para assim entender e valorizar o meu leito.

– Mas eu nunca desejei conhecer aquele vale, bastam-me estas areias e este luar!

– Você foge de você mesmo, você se esconde dentro de você, você se acovardou diante dos acontecimentos, experimentou o amor, na decepção julga que todos os outros amores também vão decepcioná-lo, foge do fogo do amor, tem medo de ser novamente queimado.

– Eu não sou covarde, nem fujo do amor!

– Não é o que eu sinto, você tem medo de amar, de se apaixonar outra vez. Aquele que fugir deste fogo será por ele queimado, aquele que por ele passar será purificado.

– Você diz assim é porque não sabe o que é sofrer por amar!

– Eu me encontrei no seu deserto, mas você só se encontrara na minha planície, não será fugindo do amor que você aprenderá a amar, veja que as minhas águas estão sendo absorvidas pelas areias, renascerei! E você? Lembre-se, Aquele que fugir do fogo do amor será por ele queimado, Aquele que por ele passar será purificado. Em tudo existe um preço a ser pago, até a felicidade para ser alcançada é necessário das vezes longos sacrifícios e muitas dores, assim enquanto não conheceres a si em toda a sua plenitude não estará pronto para amar. Você já conhece a dor, agora precisa conhecer o outro lado da sua fortuna, a felicidade, à sua frente há um oceano de oportunidades para ser feliz ou infeliz, tudo dependerá de suas escolhas, e não recuse lição alguma, nem lamentes os fracassos, nem se esconda, lamentaras sim das oportunidades perdidas, dos sonhos que sempre ficaram sendo sonhos, normalmente quando lamentamos é porque não há mais tempo para vivenciar estes sonhos, é muitas das vezes é nestes sonhos é que estava a nossa felicidade.

– Você esta me atemorizando!

– Nada mais atemoriza um homem que mostra-lo a si próprio! E o rio perdido na terra desapareceu...

E o moço ficou pensativo olhando para aquela lua tão linda, agora tão distante, seu olhar vagou pelo deserto que tanto ama, mas desejou se conhecer...

Caminhou na direção do vale...

Magnu Max Bomfim
Enviado por Magnu Max Bomfim em 15/02/2011
Reeditado em 06/08/2013
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