Sou Vel, nunca completa.
Prazer em conhecer
este seu mundinho vil.
Eu sou eu, sol Vel,
sou eu mesma
e isso já fazem vinte e poucos anos.
Há algumas horas
crescia ainda a árvore em meu quarto,
pensava em suicídio,
mas meu nome é Vel
e não sou vencida assim.
Não me mostro em público
sem máscara e cabeça baixa,
nunca preocupando-me com pouca coisa,
e nada aos olhos me é grande suficiente.
Venho de uma cidadezinha
onde o rio corre para os dois lados.
Vivo em uma casa vazia,
não gosto muito de cozinhar
e escondo-me atrás do violão,
dos cachos ruivos e do largo sorriso.
Aos amigos não tenho mais que cinco minutos
entre uma ida e volta
de uma ida e outra ao supermercado.
Preciso ser rápida
pois tenho coisas à consertar,
além do forno,
os dentes e a barriga.
Nela chego às dezoito todo dia
atravessando fumaças de negro-prazer.
Embaixo dos braços trago alegria,
não deixando por ela me corromper.
Vejo esta fumaça à volta de todos,
seus tristes rostos, eu à iluminar.
Me preocupa a revolta dos pequenos
ou a soberba dos burgueses,
a ganância dos capitalistas
ou abuso dos ordenados.
Nunca gostei muito de política
mas procuro entendê-la.
Por hora, esqueço da porta para fora
entre tudo e muitos, os falsos
(falsos sorrisos, falsos cabelos,
falsos olhos e olhares)
se despedaçam sobre meu tapete de boas vindas.
Reservo-me esta maravilhosa liberdade.
Lembro-me dias passados
em noites fosforescentes demais,
adorando dançar com você
e o lado louco da vida
que mergulhei de cabeça.
Foi quando perto demais
onde você pôde me encontrar.
É simples assim me achar
aonde meus pés estiverem é meu lar,
longe chego correndo assim.
Vários meses findaram
em esperanças renovadas,
coisas a se aprender.
Em cima do telhado as dores,
dentro do peito rancores,
quando descobri, sou linda!
Você, minha vida,
apenas um detalhe
quando queres me deixar.
Esse tempo até aqui,
guardada para você.
Alguns anos se foram,
os melhores bem ao fundo,
nos cantos junto às moedas.
Me lembro ainda
de quando jovens eram as árvores
perfumavam eucalipto meus cabelos.
A muito abandonei
os chinelos de sola ao Sol,
a vontade de ser bailarina
ou simples pedalar.
Não me ensinaram piano ou mentir,
lidero guerrilhas sem palmas por isso.
Mente insensata loucura
alimentei desde então.
O começo foi dourado,
havia amor talvez,
riqueza em cada “a-pique”.
O motivo não descobri
mas algo grande há guardado
por traz de cada foto amarelada.
Eu sei,
tenho uma luz,
é algo que não me deixa em paz,
é algo que me conduz.
Quando cheguei do futuro,
nunca acostumada
ao seu mundo em preto-e-branco,
a high-tec revolucionária.
Eu sou uma manhã de outubro
caminhando sozinha pelo Central Park,
sou minha esquina e meu jornal,
meu teto amarelo
e o vôo da mariposa solitária
em cárcere em casa.
Eu sou uma lâmpada nova
em meu abajur quebrado.
Confidências à máquina de café:
sou meu café forte.
Sou o homem da luz
que decapitou a árvore
desabrigando o joão-de-barro.
Sou desde a água de arroz
à um esticado domingo no terraço.
A voz de um ensolarado dia
ecoando, ecoando, ecoando
não meus ouvidos a dentro,
sim montanhas e planícies a longe.
Não, não sou mais aquela morta
com a cabeça no gás do forno
mas acabo de me lembrar,
guardei suas roupas no freezer
caso você voltar,
retiro uma hora antes
do fim do mundo acabar.
A vida é uma letra de música que ouvi,
dizia:
“Eu lhe mostrarei algo simplesmente bom,
quando você abrir seu coração
verá todas as palavras de desesperança
em pedaços pelo chão.
Eu acho que é hora de crescer.
Você me faz chorar quando mente.
Se não acredita no que digo,
veja meus olhos como estão vermelhos.
Meninos não choram”.
E outra qualquer do Gil.
Cantarei até o fim.
Sinto muito,
nunca quis partir seu coração.