Ponto Esparso 0

A vida pendurada

No fio do telefone.

A pose imaculada;

Outro rosto sem nome.

O pijama, cansado

De ser sempre escolhido.

O tempo, amassado

Em mais um comprimido.

Esse é para o coração,

Dizia, aos desconhecidos;

Outra era a razão

Por ter o pulso ferido.

Muito pouco lhe faltava

E não era livre arbítrio.

Sua mente soluçava

Por não crer no finito.

Quebrou a si, por muito.

Por pouco, virava ruído

E saía do recinto surdo:

Corria rumo a seu umbigo.

Desfaço mal minha mala

De pesares urgentes;

No cadafalso, na sala,

Me achando menos gente.

Poupe minha mente,

Tristeza que abala.

O mal vai em frente

E assim, me empala.

Outro fim conivente

Para outro dia frio.

Hoje sou ausente

Em meu próprio covil.

Desmontado o cadafalso

Me resta a metáfora.

Por aqui me desfaço:

Um déspota de meia sala.

O reinado é meu nada,

Pendurado no telefone.

No canto sujo da sala,

Ser quedado, ouço o nome.

O nome que foi meu

Antes da depressão.

Um ser me acolheu

Ruidando, em baixa

[vibração.

"Como vai você?

Sim, sob sigilo.

Vamos vencer;

Sou toda ouvidos.

Estou aqui para ajudar.

Não faça isso, não!

Prometa não se calar;

Lhe dou o braço e a mão."

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O pijama puído

Resolveu se trocar.

O coração, comprimido,

Voltara à pulsar.

Era pouco, sim,

Mas fez-me voltar.

Voltei à mim.

Pretendia ficar.

A mente soluçava, ainda.

No pulso, a ferida, ainda.

Mas aos poucos, segue;

Segue, calma e leve.

E quando pesa,

Penduro-me a ligar.

Ligo às pressas

Até me cansar.

Vivo só,

Considerara tentar.

Tive dó,

Lembrei de ligar

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Sem móveis no apartamento.

Vivo pobre, sem aumento:

Quem sabe o 141 me salva;

Limpa o mal tempo,

Me preenche de calma;

Valoriza meus momentos,

Me diz que logo passa.

Quem sabe amanhã melhore.

Quem sabe melhore.

No canto da sala,

Digo baixo, insone;

Escorro logo, ao fone:

Escape, velho nome,

Pela memória que me falha.

O vazio só atrapalha:

É ele que corrompe.

Do outro lado, ouvem,

Perguntam o que se passa.

E a voz logo esconde:

Nada, não houve nada.

Sou eu quem responde;

Não é minha a voz que fala.

De quem é este telefone?

De quem é esta sala?

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Repost de www.alberguesepia.com.br (06/05/2016)