ANTENOITE
 
Quarta. 24 de agosto de 2016. Daqui a um ano, já não devo mais estar por aqui. Mas e daí, se sou um cão turbulento, um ninguém? De qualquer forma, vou para o mesmo destino de que ao anjo-sapiens, o frio e eterno apagamento.

Desde já, porém, já me tornei um ciclone desativado e já me ando despido de qualquer máscara, de qualquer veste e de qualquer coisa que me queira vestir pelo resto de meu tempo.

É claro, e confesso, que já alimentei a fome e a sede de muitos egos, com seus amores, desejos e delírios sem norte. É claro também que já comi de tudo que existe, com insaciável apetite. Já fui a vontade dos outros e a que, a mim mesmo, consome-me. Insaciavel e impiedosamente, um canibal, digamos.

Enfim, fui um exemplar bem humano, e demasiado humano. E, assim, não mais me restaria mesmo, ao fim, passar-me de um grande fiasco.

Lógico também que já amei puramente, assim como tracei tortuosos caminhos a quem dizia me amar completamente. Sou, hoje, uma consciência mais firme de minha chagada condição.

Punhetas, por exemplo, não faço ideia de quantas já bati, até por donas que nunca souberam de tal ato libidinoso que vinha à minha mente e refletia em minha genitária enrijecida.

Já fui amante, carrasco, asco, sol, chuva e etecetera, enfim. Tento expor minhas verdadeira humanidade como se fossem todos meus espelhos, e isso há muito tem sido meu maior pesadelo. Ser suas imagens nuas e cruas, sob o ponto de vista de mim mesmo é condenar o mundo.

Sei disso, bem sei disso, pois fui como um córrego onde tudo corria sem piedade, quando se tratava do ser.

Bem, isso talvez eu ainda seja, na verdade, que o pesadelo de ser humano ainda em mim constantemente se insinua.

Então sempre sou o amor de alguém, a dor de alguém, a alegria e o choro de alguém, o delílio e o desprezo de alguém, a certeza e a perpétua dúvida de alguém, o porto e o alto-mar de alguém.

Sou, assim, o muito que não é do que meus sencientes olhos podem ver. Um caminho de muito mais quedas do que de vitórias. E, mesmo as vitórias, não se houveram sem maus cheiros sudorentos emanados de mim.

Concluindo, pois, podem me considerar como o cão, como a mentira das verdades, como o dono das vaidades negadas, como o demônio vestido de anjo, como o refúgio da falsidade, como o desprotegido pesadelo, como uma causa perdida, como uma liberdade cercada por terríveis grades.

Mas seria melhor, e realmente melhor, que me vissem como serei dentro em breve. UM NINGUÉM, porque estou com a alma cansada e me transformei numa causa perdida entremeio às coisas que ainda há e que pode ainda vos alumiar!

Indo agora para a próxima batalha, de pé, como humano que Deus me fez, até que a inexorável derrota se consuma em minha morte!
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Chamam-me ainda de Thor Menkent, o cão niilista. 
Mas sugiro que me considerem agora como NINGUÉM
ou, no máximo, um pouco só a mais que NINGUÉM,
até que chegue minha hora.
Péricles Alves de Oliveira (Thor Menkent)
Enviado por Péricles Alves de Oliveira (Thor Menkent) em 24/08/2016
Reeditado em 24/08/2016
Código do texto: T5738370
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