Imperatriz

Choveu uma chuva

que lavou o mundo, os tolos,

indecisos e as corcundas

inflamadas das rebeliões mortas.

as vassouras e as árvores,

e as velhas minhas vizinhas,

adornaram-se como se indo a uma festa,

brilhando e sorindo,

molhadas e pesadas deslizando rua abaixo.

Lavando tudo. Levando tudo de casa

minha avó, que há milênios me habitava,

partiu por medo de uma tempestade.

Choveu uma chuva clara que caiu de

um céu negro, e a turbidez

dos olhos se desfez.

Choveu uma chuva cortante

como navalha, riscando

a pele dobrada

e enraivescendo a mente

carcomida.

Choveu nas prisões e sobre

os balões, e sobre as línguas

inchadas os gritos de júbilo

encalhavam.

graves segredos caíram do

céu distante, e por detrás das

mesas e nas camas de hospitais

os homens martelaram o céu,

tentando tapar os buracos

e os desabafos das multidões.

e arrastando os grilhões,

meu avô que há milênios era livre,

sentiu o cansaço de esperar,

e sentiu chicoteando-lhe as costas

o estalo molhado de um beijo.

choveu uma chuva

que lavou o mundo, as bocas,

as estradas e as pessoas

derretidas que escorriam pelas paredes.

Choveu uma chuva ditosa, desejosa

e descontente, que dissolveu as fantasias

e reguardou os sonhos na estante da sala.

Hans Cristian Koch
Enviado por Hans Cristian Koch em 16/12/2013
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