BONECA DE TRAPO
BONECA DE TRAPO
Ela era linda...
Assim esquecida sobre as almofadas...
Com a cara meio triste...
Com a boca borrada...
Cheia de meiguice...
Estirada e enrolada na colcha de cetim...
Com a cara espantada quando eu chorava...
Querendo salvar-me de minhas doidices...
Ela era linda... Mas eu a deixava abandonada...
Na beira da cama... Sobre a escrivaninha...
Comendo poeira, no canto da sala...
No quarto escuro... Chorando e sozinha...
Ela era minha e eu não sabia...
O quanto valia... Sua companhia...
Saindo com as amigas...
E não a incluindo em minhas aventurinhas...
Só chamava por ela quando apanhava...
Ou quando sentia medo do quarto escuro...
Abraçando-a só por medo... Sem nenhum carinho...
Ela era linda...
E eu preocupada com minha vaidade...
Penteando os cabelos... Calçando um sapato novo...
Correndo de um lado para o outro...
Coisas de menina...
E o tempo foi passando... E meus cabelos crescendo...
E eu não achando tempo para perder com brinquedos...
Foi ficando ocupada...
Com os sonhos, os bombons e os moços...
Sem querer deixei minha fiel amiga na solidão...
Com os olhos de botão numa mala...
Feito trapo de chão...
Ela era linda, mas eu cresci...
E até me esquecendo de sorrir para Beatriz...
A minha melhor amiga feita de trapo e giz...
Com os olhos de botão azuis...
Como fui dura... Como pude ser tão ingrata...
Bia no sótão jogada...
Era um pedaço de mim...
Aquela boneca tinha alma...
Pois somente ela podia me fazer sorrir...
Poesia Marisa Zenatte.
(Escrevi estas linhas debulhada em lágrimas... Como é preciso tão pouco para uma criança ser feliz)