Ode a uma Ferradura

Esteve ali à mercê do tempo,

semi-sepultada, não morta.

Um ômega gasto e solitário,

apartada dos seus

e do verdadeiro destino,

como âncora sem navio.

Deixando coxear

uma cavalgadura,

ficou ali esquecida.

Somente um cravo

a acompanhara,

já desfigurado e inútil

como a chuva tardia.

Um dia ao acaso

a encontrei e tirei-a da terra.

joguei-a em meu alforje

e segui caminho!

Por um momento ela acreditou

que um ferreiro a devolveria

à labuta.

Sonhou ouvir novamente

o tropel sobre as pedras,

arrancando delas

o sangue faiscoso.

E sobre a secura do chão

levantando a poeira!

Singrou várias léguas,

não como desejava, ia em meu alforje,

Ia machucada de ferrugem

soltando pó de sangue e terra.

Não sentia o arrocho dum casco,

nem a companhia das outras...

Não servirá a mais nenhuma cavalgada!

Veio para o sono dos justos.

Tudo ficou para trás.

Hoje, repousa na minha velha porta

junto a uma antiga aldrava

de semelhante forma.

Oh! Essa pequena lira

de sons outrora troantes.

Tive sorte ao encontrá-la!

A inspiração era escassa,

as palavras já não vinham...

Dizem que um poeta morre

se não escreve mais.

Tive sorte ao encontrá-la,

e me basta essa sorte!

José Alberto Lopes ®

18/06/2012

José Alberto Lopes
Enviado por José Alberto Lopes em 18/06/2012
Reeditado em 16/07/2022
Código do texto: T3731699
Classificação de conteúdo: seguro