O MENINO QUE VOCÊ NÃO AMOU
eu era seu cão fiel,
mas você me prendeu na coleira;
eu era seu gato lindo,
e por ser lindo,
você me trancou em casa;
eu era o pássaro
que cantava só para você,
mas você me colocou em uma gaiola;
eu era seu pôr de sol colorido,
então, você me tingiu de noite sem luar;
eu era seu livro predileto,
mas você me escondeu na estante;
eu era seu companheiro de caminhadas,
mas você me trancou no quarto;
eu era o puro sorriso de alegria,
mas você se alegrava com meu pranto;
eu era o pai de suas boas ideias
mas você praticou alienação parental sem dó;
eu era seu amigo, por dias e dias,
mas você me viu como inimigo em noites a fio;
eu era as carícias suaves ao vento,
mas você soprava palavras como pedras;
eu era o seu céu noites adentro,
mas você fazia dos meus dias um inferno;
eu era o tudo que você tinha,
diante do nada que você sempre buscava;
eu era o seu porto seguro
mas você preferia mares agitados e tempestades;
eu era o calor que aquecia seu corpo,
mas você me congelava até a alma;
eu era a calma nos dias ruins,
mas você fazia tempestade em copos d’água;
eu era o bálsamo que curava as chagas
mas você era a faca afiada na ferida aberta;
eu almejava para você sempre o ponto mais alto
e você só me conduzia ao abismo;
eu sempre chegava sorrindo
e você me fazia chorar na despedida;
eu era o campo ao ar livre
mas você morava em uma cela sem portas nem janelas;
eu era,
eu fui
e ainda sou;
e você nem ao menos me conheceu:
adeus!