UMA PAIXÃO DE DÉCADAS

 
 
Eu nunca tive um Fusca,
 
mas meu pai amava o seu,
 
e cuidava do bichinho,
 
da capota ao pneu!
 
E era tanto desvelo,
 
parecia filho amado,
 
e feliz com tanto  zelo,
 
o carro andava aprumado.
 
- dava inveja nos carrões
 
que passavam a seu lado,
 
 e seguia, todo emproado
 
pelo caminho traçado.
 
Fazia o seu trabalho
 
como um bom funcionário,
 
daqueles que até parecem
 
dispensar o seu salário,
 
 e trabalham só por prazer
 
de ser, também, solidário.
 
Já velhinho, coitadinho,
 
continuava na luta,
 
pois meu pai não dispensava
 
o carrinho da labuta.
 
Até que chegou o dia
 
em que meu pai já não podia
 
conduzi-lo pelas ruas.
 
Não por culpa do carrinho,
 
mas porque seu proprietário
 
já estava bem velhinho...
 
E, esquecido na garagem,
 
ele ficou por um tempo,
 
até que chegou o momento
 
de servir a outro dono.
 
E assim, lá se foi ele,
 
diante dos olhos baços
 
daquele seu grande amigo,
 
mas foi levando consigo
 
toda a sua gratidão,
 
por tê-lo sempre servido
 
como se serve a um irmão.
 
Eu o vi algumas vezes,
 
desfilando por aí,
 
mesmo depois de meu pai
 
não estar mais por aqui...
 
 
*****
 
RJ, 20/04/11