Saber calar

Os perfeitos não confiam em sombras. Elas existem?.

Os perfeitos moram na barriga de Deus.

Nós imperfeitos, não. A terra nem quer para semente,

mesmo assim, zanzamos por ai, semeando.

Calados sim, submissos, nunca.

Só isso.

Eis que a vida se perde por falta,

mas a falta que perde é a sobra que somos.

Quando eu quis me encontrar,

achei-me imerso num pequeno rio.

num riacho, num córrego. Nunca aprendemos nada:

a não ser nadar só contra a maré.

E só.

A vida é mesmo assim: terrível encontro de dez.

Muitos desencontros.

O que resta de mim agora é a sombra que existe.

Tudo fora de lugar, na rota insólita da vida.

Como se faltasse alguma coisa,

e sobrasse apenas metáfora de frágeis seres!

Frágeis imensos, imersos à submersos,

pois nunca sabemos onde estamos.

Saber calar é tudo ou nada.

Dependendo de quem fala, para desvendar.

Um nó.

Parte de mim é uma bela chegada.

A outra parte é uma vontade de sair.

O que se faz na vida é lapidar a lápide,

para enterrar inúteis felicidades.

Enquanto a vida passa faladeira,

a nossa mudez de amanhã será eterna,

pois escrever nunca é tarde demais.

Saber calar agora, é ver o vento carregar as horas.

Do pó se volta ao pó.

E só!