DESERTO

DESERTO

Aproximo-me do deserto

Sem cara fechada ou sorriso

Nada mais quero

Além de comer, beber, dormir

E ler, escrever sem compromisso

Chega de ambições e sonhos

Vez por outra ainda tenho recordações

E batem saudades teimosas

Do mar, da linha do horizonte

Do desejo aceso pela amada

Já não sei muito quem sou

O espelho não me reflete

O vinho igual já não desce

Mas a revolta não vem

A apatia do viver é sobreviver

Os dias passam inexoráveis

Com cores desbotadas

O azul céu é pálido

A terá roxa é vermelha

A nuvem branca é cinza

Quando muito rósea

Em manhãs prolixas

Lastreadas de complexidade

Nas janelas do tempo

Tempo de chuva, sol, vento, ares

Que cortinas fechadas não veem

Devaneiam sem nexo ou sexo

Apenas respiram a sensação

De estar vivo apesar de tudo

De contudo, de porém, de mas

Nada demais tampouco de menos

Num fundo confuso de fatalidade

O relógio já não bate

É vermelho digital

Durmo sem dormir

No silêncio do escuro

No espaço sem ruídos

Quem sabe acorde

Com acordes de pássaros

Ou pombas da paz

Na consciência do estar

Absurdamente vivo

Arnaldo Ferreira
Enviado por Arnaldo Ferreira em 27/01/2024
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