deixe um coraçãozinho
me sinto insuportável
como o gosto de fel
como o cheiro do gás
escapando nos táxis daqui
como o sol das 14h
mas também me sinto suportável
o que é cruelmente pior
me sinto tolerada por quem
é tolerante
e engolida por quem é educado
não posso com
as redes (anti) sociais
me sinto traída
não quero ver quem está na mira
do grande irmão
nem aceitar solicitações
de homens que me viram na rua
há pouco
nem ver os casais
muito menos os sozinhos
gente sem camisa ou bundas
sabiamente anguladas
não que eu seja
contra o ângulo
biquínis protagonistas
meninos posturados
espelhos de academia
não me importo também
se aquele ator daquela peça
que eu vi ano passado
está na Chapada
se curando na água
ou quem está curtindo
todas as fotos sugestivas
das webcelebridades
e vejo que são todos os
homens que conheço
porque agora isso é ser solteiro
deixar seu nome e sobrenome
no corpo de uma menina
com no mínimo um milhão de seguidores
ou nas famosas locais
claro
marcando seu espaço
cultivando falso afeto
e colhendo a doce sensação
de estar aproveitando
acho que temos
afinal
a Pasárgada pós-moderna
é um ciberespaço onde tudo
pode
nada se deve
e a única regra
é se plastificar
onde os solteiros são toscos
e os comprometidos são solteiros
onde tudo me irrita
inclusive quando eu invento
de fazer parte
seja fazendo graça
seja me expondo
seja querendo ser bonita-de-Instagram
seja querendo flertar
seja querendo ceder
e me arrependendo em seguida
acho que não sou eu
que são tão insuportável assim