Essa tarde

Esta tarde, eu disporia sobre a mesa,

Na mesma mesa em que repousa

Uma família ostensivamente contente,

Saboreando à margem das palavras,

Uma odisseia monótona de vida despojada.

As palavras entrelaçadas com a carne,

Digere-se e deglute-se em volúpia.

Esta tarde adentra a janela e também

Resplandece na rua, onde as árvores brilham,

Com seus frutos tombando na própria sombra,

Quando o vento os acomete com temor.

Esta mesa, onde os pais desses pais, outrora, formularam

Seus outros vãos de relevância, seus vestígios

De memórias, que como sangue de carne viva,

Escoam e contam algo que não é de todos sabido:

A vida transcende a mera flor e folha que a adornam.

Esta tarde, tantas vezes após ser emendada por outras,

Estampou a face de homens, cuja

Dignidade equiparava-se a uma tarde, mas que

Também iluminou aquelas casas, aquelas que

Nossos olhos tremem ao perceber que seu

Piso não suporta o peso, nem a vertigem dos

Que ali permanecem, na enfermidade subjulgada pelo tempo.

Nessa mesa, onde a família se ajusta à expectativa,

Eu estamparia esta tarde, clara e livre,

Com a alegria que se distende dessa agonia disfarçada.