o dizer e o contar
O inverno chegou, e ele, como ele mesmo,
Esse sereno real, esse turvo, nas artérias,
Em fogo baixo mantem as coisas vivas, assinala
Que embaixo da pedra um imenso rio continua
Sua labuta, engolindo o tempo e fazendo do futuro
Suas pernas aplumadas que se afasta sempre chegando,
Tenho dito, a poesia, cavalo feroz, mas encantada
Porque mora em duas margem, nos acorda, seja
No edifício mais alto, ou à beira, nas cordas, não
É dama bagunçada, colher suas flores, sua delicia,
Sua lindeza violenta, ou seu barulho, tremo e sou extremo,
flor bela no cofre insolente, a permanência do rio, que
É, como todo, mas nunca como parte, o giro é perigoso,
E a amamos, escreve-la é mais fácil, mas difícil saber
De sua visita e fazer pra ela, a sala mais acolhedora, e
no entanto, no seixo que cobre, passivo, a escoriada estrada,
Nos deitamos, e sabemos que nossas costas não
Existe, outros, o sexo, alguns os braços, imenso continente de pele,
Assim, a espera, esse ilha gigantesca, soturno tédio
Melancólico, abrimos que já estava aberto, amamos
Que já é amado, então os lábios de uma vulva viva
E carnal, nos lambe, nos beija, nos sabe mais que máscaras,
Lavas entronada, mas lavadeiras delirantes à procura
De nada, então palavras, signos e paredes dissolvendo,
Nascer é doer, assim como viver, e pingando sangue,
nervosa queda, e o precipício irmana com o destino,
e os queremos, somos, eu, a vida que foi garfada,
Os versos nascem, com sorte, o mundo os abraçarão,
Pois, de longe, tem na sua natureza, o dizer e o contar
a cidade está feita sobre um abismo.