eu não sirvo à sociedade

sabe, a sociedade

é lugar pequeno demais

pra mim.

não sou muito feliz aqui.

se eu pudesse morar com os anjos,

ou com os bichos;

ser uma árvore, quem sabe,

uma mexeriqueira – que delícia!

eu seria verde, com aquela cor de caule, fotossintético

e me enfeitaria de tons alaranjados,

no tempo

- como um pinheiro de natal,

no seu tempo.

mas na sociedade, sou homem

e tenho de ser de respeito,

e ficar cumprindo tarefas,

explicando-me à gente ocupada e pre-

ocupada,

e ainda manter (se eu fosse

como os outros)

essa coisa miúda e burguesa que chamam status,

com roupas e adereços, e mecanismos

computados pra isso.

ah! que infeliz é viver assim!

a sociedade é lugar claustrofóbico pra mim.

se eu fosse uma mexeriqueira!

já viu o cheiro que tem!?

o gostinho do chá!?

já a gente, socioeconomicamente compro-

missada, tem um gostinho amargo

que dá dó; late mais irritantemente

que um pinscher;

faz cocô, como as pombas,

nas cabeças;

contamina de raiva,

como ratos – e se acha abençoada!

acha-se doutora, profissional, exemplar,

comparativa,

inteligente... com aquelas caras

sérias e desgostosas.

que gente pequena pra onde

eu vim morar!

um dia eu me torno mexeriqueira

e fico observando em um plano dimensional

mais belo e mais alto

a beleza do vento a soprar

e da chuva a chover

- sem e-mails, contratos, web-

-compromissos...

coisas que vão nos levando à morte

bem antes de a funerária

nos visitar.