Contemplação
A janela aberta por onde venta
um ar frio que perpassa a fenda
do corpo onde o espírito assenta
como se preso num pano a renda.
Entram também algumas ideias
que incomodam desde sempre
e ela em busca de si por panaceias
mas, “Não há quem lembre!”
A janela faz-lhe lembrar o templo
e o tempo que sua mãe devotava
e ela era: “Não contemplo!”
e sua mãe a exortava.
Pela janela entra a mãe com o vento
e sua voz sussurra em exortação
e ela nada, sem sentimento,
sem lágrimas, sem emoção.
Leu a Bíblia: de Gênesis a Apocalipse.
Leu os santos, os sábios e a Filosofia.
Nada de revelação, somente eclipse,
sem sossego, sem sabedoria.
Uma foto de sua mãe: na arca da sala.
O Livro aberto: sobre a mesa de centro.
A mãe imóvel e enfim sem fala.
O vento apagando as letras de dentro.
Fecha a janela e destrói o templo,
sem vento, sem presença, ela só,
só agora: “Contemplo! Contemplo!”
Não há pano, nem renda, só o pó!