Identidade
Eu sou a prosa morta do cantador
A carne esturricada pelo sol das onze
A estrela cansada que brilha longe
Acabada e rota em seu decurso
Eu sou o grito grave do último homem
A gutural lamentação do nordestino
O badalar exausto do antigo sino
Chamando quem ainda deveras crê
Eu sou a cor doente da rosa pálida
O caule torto da flor sozinha
Regozijando as dores minhas
Vendo arder a furta mágoa da renúncia
Eu sou o manto austero do padre velho
O desalento do portão enferrujado
A penúria do espírito açoitado
Na noite vaga da imensidão do campo
Eu sou o descompasso da poesia
O olho deserto da senhora viúva
Não sou a água, mas a espuma
A crista que emerge no mar de agosto
Tão exausto é o mundo
E tão cheio de nada...