NÔMADE

"Já que a ordem do mundo é regulada pela morte, talvez convenha a Deus que não acreditemos nele e que lutemos com todas as nossas forças contra a morte, sem erguer os olhos para o céu, onde ele se cala".

ALBERT CAMUS, “A PESTE”

I

Já não posso dormir ou falar

Porque tudo é imundo

E todo gesto é uma violação.

II

Eles vieram e se acomodaram

E a mim nada disseram:

Adentraram minha alma e a envenenaram.

III

O preciso momento:

Fluxo de pensamento.

O nômade encontra o lar

No mundo.

IV

Controle, cátedras, corcéis

Espancando a dor e moendo

Carne na máquina do medo.

V

Pensei, aprendi e esqueci.

E me tornei vil

Pela vontade de lembrar.

VI

Vai mundo!

Corra aos tropeços pelas ruas de Deus!

Flutue imóvel sobre a jangada do universo.

VII

A lógica fascista;

A lógica budista;

A lógica com a vontade de comer.

VIII

Aquele homem ali sentado

Parece imóvel, parece morto.

Parece esquecido, parece esquecer.

IX

O poeta cantou o concreto

Em sua dureza e aridez.

Tirou lágrimas de pedras.

X

O teu beijo é como uma faca.

Tua boca corta meu corpo.

O vermelho dos teus lábios é meu sangue.