O Grito Pela Vida

Que o medo e o exótico destemido não me tirem o encanto pela beleza da criação.

Que o chão e a poeira levantada nunca depreciem o assombro que sinto pelo belo.

Quero deslizar os dedos na água enquanto gente, conversar com a lua que não fala nem ouve, contar as incontáveis estrelas do céu com esperança de um dia terminar o feito. Quem sabe assim fico submerso num universo onde eu possa me sentir livre pra viver.

Que o segredo e o oculto sejam o motivo da empolgante busca e o enigma seja surpreendentemente decifrado antes do anoitecer.

Que o sabor e a beleza das doces palavras de uma bela poesia de amor nunca se acabem, e sejam substituídas pelas longas linhas da academia.

Quero continuar assombrado pelas coisas mais inglórias desta vida. Quem sabe assim encontro um motivo pra deixar escorrer, no rosto, lagrimas que dão significado às emoções que carrego na alma.

Que o conhecimento e o esclarecimento que se achegam não me deixem apático diante da chuva que cai e do vento que sopra.

Que a ciência e a experiência que aos outros silencia nunca ofusquem o espanto que sinto e preciso pra me sentir humano.

Quero sair de casa sem guarda-chuva, desapercebido do tempo, e me dar o luxo de desfrutar da sensação única que é sentir a chuva escorrendo pelo corpo. Quem sabe assim demonstro a criança que sou pra que conheçam o adulto que quero ser.

Que o desamor e o rancor não ofusquem a paixão do adolescente que cresce, e que as imensas borboletas continuem sobrevoando o íntimo da pessoa que ama diante da pessoa amada.

Que dia e noite os moços amem, dia e noite as moças se apaixonem, os velhos se cuidem e as famílias sejam respeitadas.

Quero continuar no recanto do encanto, apaixonado pelas coisas que os incautos não admiram. Quem sabe assim passeio feliz pelos labirintos do amor sem nenhuma pretensão de encontrar a saída.

Que eu não fique emudecido diante da angústia do órfão e do choro da viúva.

Que a injustiça me deixe em pânico e a desigualdade me deixe atordoado até que se faça algo em prol dos marginalizados.

Quero oferecer misericórdia ao invés de sacrifícios. Quem sabe assim eu alargo as fronteiras do amor.

Que eu nunca me acostume com a formosura do crepúsculo.

Que eu perca o fôlego diante da beleza do arco-íris que se impõe quando a chuva cessa.

Quero afogar-me na imensidão do amor pela vida e mesmo assim continuar tendo um caso com ela. Quem sabe assim perco o senso do tempo e vivo a vida como ela merece.

Aliás, Se a água for apenas H2O, o choro de um homem ferido sinônimo de fraqueza, se brincar com os pés descalços for apenas um atentado à saúde, prefiro permanecer ingênuo e deliciar-me das alegrias que a vida me reserva.

Não quero ser prisioneiro do medo, incapacitado pela culpa e exaurido pelos escrúpulos. Quero ser o oposto!