À MUSA DA HISTÓRIA
ODE PARAFRÁSTICA
I
" Tu que amarraste a um poste a alma de Luiz Onze"
" E beijaste chorando a fronte de Jesus",
" Dá-me, para escrever, o teu gládio de bronze"
" Que ás vitórias do Bem as gerações conduz!"
.......................................................................
Musa! Brumas não há que o Verbo teu não rompa,
Nem grimpas colossais que não possa galgar...
Embocas da Verdade a clangorosa trompa
E os teus lábios de sol ninguém pode fechar,
Da Humanidade a vida a tua vida abrange,
Um século a contar como um segundo vão,
Pois dos séculos deixa apenas a falange
Um efêmera esteira, à flor dessa amplidão.
A sorte das Nações lembra um grande navio
Cercado de parcéis, neblinas, vendavais;
Ora, o naufrágio o atira ao báratro sombrio,
Ora, repousa altivo em portos ideais,
Há um braço que enfreia a boca das lufadas;
Há na treva mais vil, sempre, um raio de luz;
Quando a algum funeral respondem gargalhadas,
Fala uma ignota voz que o Poeta, só, traduz.
Os séculos, irmãos sublimes e dispersos,
Estranhos pela Sina e pela Crença iguais,
Ao mesmo porto vão, por trilhos bem diversos,
Jorrando a mesma luz dos seus altos fanais.
II
Vítima que ninguém consola a ninguém ouve,
Algozes, cuja raça em vão pode crescer,
Olvidar não deveis que um braço sempre houve
Para vos elevar, para vos abater!
Lembrai-vos que essa Musa, entre um raio e uma prece,
Sacode em cada Noite o seu facho imortal;
Paira sobre a montanha, aos precipício desce,
Diademando o Bem e amordaçando o Mal.
Quando atinge do Povo o sofrimento o cúmulo,
Essa Musa é quem manda o Povo então marchar;
Erguendo sempre um templo, onde faltava um túmulo,
E um negro pelourinho, onde havia um altar.
À fronte dos Heróis é quem atira os louros
E escreve a sangue e a fogo os nomes perenais;
E quem da Idéia espalha os fúlgidos tesouros,
E dos Césares quebra os carros triunfais.
Do Panteon, soberba, os degráus dominando,
É quem, fitando o céu, manda o Gênio subir,
Enquanto a férrea mão, nas trevas mergulhando,
Todo o Passado arrasta à frente do Porvir.
A recolher, piedosa, os lúgubre destroços
Dos naufrágios, que á plaga as ondas vêm lançar,
Púrpuras e buréis, - presos ainda aos ossos -
Pelos mares afora estende o claro olhar...
E, acompanhando alerta a santa caravela,
Que leva no seu bojo a sorte das Nações,
Há de ficar de pé - suprema sentinela -
Há de ficar de guarda, ouvindo as multidões,
Entre o primeiro Berço e a Cova derradeira,
Entre o primeiro Crime e o derradeiro Amor,
Até que o Mundo enfim, se converta em poeira
E tombe o velho Sol,dos céus, roxo de horror!
......................................................................
Musa! Brumas não há que o Verbo teu não rompa,
Nem grimpas colossais que não possas galgar:
Empresta-me o clamor da tua bronze trompa,
Empresta-me o clarão do teu divino olhar!
1900 - "Suprema Epopéia."