Salmo

Deve ser porque sonho demais acordado

que parece

tenho séculos vivido

Quando durmo, não lembro o que sonho...

Preciso mesmo

de sono e descanso

pra durante o dia seguir sonhando

e realizando

Quem me cerca não sabe

não repara, nem sonha

(precisaria estar dormindo...)

Tenho tudo

Ando assim, pelas ruas, no meu reino

de coroa e cetro de luz

de brilho maior, que de metal...

E esses loucos, essa maioria, que me cerca

esses, que dizem rindo um deboche

esses cegos

que cospem quando passo

que tentam me alvejar, bactérias

fazem juntar essa gosma

sob meus pés, que é só onde cai e acerta

E é engraçado o detalhe:

são nessas bocas, as línguas agulhas, como teares

costurando, estendendo...

um longo tapete, infinito...

que me valhe...

Se algum dia, dormindo

voltar a sonhar

tenho certeza, será aquele velho sonho conhecido

recorrente, amigo, livre:

eu voava...

Já estarei a outro mundo

em essas alturas

e eles...

cuspindo pra cima

Nota: bonito poema não? Mas perceba, como poesia é síntese e quanto mais se comprime o universo das coisas e sentimentos dentro do corpo das palavras, mais interessante e rico se apresenta. Mário Quintana, em "Poeminha do contra", disse apenas:

"Todos estes que aí estão

atravancando o meu caminho

Eles passarão

Eu passarinho!"

NOTA 2: período 2002-2008