Meninas da minha rua
Fingem ouvir o mar com ouvidos nas conchas
e brincam de roda; pedalam bicicleta.
Mostram beleza e graça, empregando seus meios:
quando plantam bananeira, alteiam as coxas;
andando sobre os saltos, empinam os seios.
Desfrutai dos folguedos, meninas de agora!
Tardes de verão, aproveitai com afinco;
hoje, crianças, amanhã, sereis senhoras.
O tempo vai, nada ele espera. Ontem foi hoje!
Se me puserdes na roda, vereis que eu brinco
com lembranças boas do meu tempo, sem pose.
E vós, meninas de outrora, onde vos metestes?
Em qual cometa abandonastes minha rua?
Em que altar subistes portando um ramalhete
de flores, para dizer sim a um noivo afoito?
E a quem vos destes com pudor de virgem nua,
gozando com sangue e dor o primeiro coito?
Tantas fostes vós a povoar meus delírios
(loirinhas, moreninhas, ruivinhas ou pardas),
mas, por força de um hipotético concílio,
crescestes e vos fizestes mulheres. Belas
e sedutoras algumas. Outras, com sardas
(contudo não menos lindas que outras donzelas).
Se, no entanto, risos e lágrimas vertidas
sulcaram-vos o corpo, e o coração rasteja,
nunca vos envergonheis das marcas da vida,
nem oculteis o rosto no meio do povo.
Aparecei, senhoras, para que eu vos veja,
pois terei prazer em conhecer-vos de novo.
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N. do A. - Na ilustração, No Jardim de Oscar-Claude Monet (França, 1840-1926).