ENXADA X CANETA

GILBERTO BRAZ ALMEIDA

Aos oito anos de idade,

no dia do meu aniversário

ganhei do meu pai

uma enxadinha de presente.

Era uma ferramenta impar,

jeitosa, novinha em folha,

cheirando a tinta.

Orgulhosamente mostrava a todos

aquela ferramenta

meio de brinquedo,

meio de verdade.

A minha amiga

era uma relíquia rara.

Às vezes em pleno

feriado escolar

ensaiava ao lado de meu pai

a arte milenar de capinar.

Gostava tanto da minha enxadinha!

Ninguém podia relar a mão nela.

Ai daquele que colocasse mão no cabo dela,

já arrumava uma tremenda confusão.

Antes do anoitecer,

lá estava eu e a enxadinha

trocando confidências.

Éramos tão amigos!...

Tínhamos lá os nossos segredos.

Não via à hora de crescer

e de me tornar rei da enxada.

A minha amiga demonstrava

ter pena de mim.

Era como se ela me aconselhasse

a levar a sério os estudos,

ser alguém na vida:

Um doutor, um professor

e por quê não um poeta?

A minha amiga estava certa,

mas eu era teimoso!

O que eu mais queria

era ser um lavrador

de mãos calejadas,

um puxador de cabo de enxada

Igualzinho o meu pai.

Era como se ela me dissesse:

_ Pobre menino!... Isso não dá futuro!...

Larga de ser tolo!... A vida de lavrador

é muita luta, muito suor e pouco pão.

Aos doze anos de idade,

também no dia do meu aniversario

ganhei pela segunda vez do meu pai

uma enxada de verdade...

Adeus escola!... Adeus professora!...

Adeus colegas estudantes!...

Troquei o caminho da escola

pelo caminho da roça.

O sol queimava a minha cabeça,

o suor molhava as minhas roupas.

As minhas mãos foram ficando grossas de calo.

O matagal não parava de crescer no cafezal.

No eito, só mato que tombava,

eu era o rei da enxada.

Aos poucos fui me esquecendo

do que aprendi na escola.

Aquela vida de lavrador

era osso duro de roer.

Aos dezoito anos de idade

dei meu grito de liberdade.

Chutei pro alto

todas as enxadas do mundo.

Troquei o campo pela cidade.

Retomei o caminho da escola

que foi a minha salvação.

Hoje as minhas mãos são finas como seda.

Com a caneta conto em versos a minha história.

A minha primeira enxadinha bem que merece

uma estátua gigante no jardim secreto de minha alma.

gilbapoeta
Enviado por gilbapoeta em 28/03/2012
Reeditado em 28/03/2012
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