NADA POÉTICA

Porque guardo segredos, não falo da verdade do meu coração.

Porque não gosto do que vejo no espelho, não reflito a beleza escondida.

Porque amo o bonito e suave, calo o ódio ao feio, ao rude, ao violento.

Porque o cotidiano é estéril, não publico os frutos da experiência dos dias.

Porque a realidade é estúpida, vivo-a silenciosamente.

Porque a desigualdade existe, apenas falar dela não a torna diferente.

Porque ser lúcido é não jogar a criança com a água do banho,

Porque existe coerência interna em optar pela felicidade como bem estar e se preocupar com as crianças famintas.

Porque dizer não à culpa e sim à lucidez.

Porque o por quê destes porquês é o subtexto deste desmando frio, a feiúra da criança na Lagoa da Pampulha, a dialética entre o bestial gesto e a beleza vitoriosa da criança viva.

Porque já não existe o indizível, o mundo berra aos nossos ouvidos o código do imponderável.

Porque assim, meu sentimento do mundo é a prosa sem poesia.

Outubro/2005