A chegada do gado
(para lembrar Guimarães Rosa, que encarnou com toda arte a cultura e a
linguagem do sertão mineiro e brasileiro)
A Chegada do Gado
O silêncio da estrada
recebe os primeiros sinais
voz de boiadeiro
mugido de animais
Aos poucos clara visão
desponta do alto da serra
e ao se chegar ao terreiro
o ofício se encerra
Desta vez queria ser
João Guimarães Rosa
e em verso e prosa contar
o sentimento da boiada
ao se ver num novo lar
O ritual de chegada
ocupa todo o espaço
e o cansaço de agora
parece libertação
Aos cavalos no esteio
afrouxamento do arreio
água, milho na cuia,
sede e fome não perdoam
Depois água farta no lombo
e o peso da carga se escoa
No corgo água fresquinha
pras novilhas e garrotes
e pros cavaleiros purinha
água de mina no pote
Só o roseano talento
narraria com destreza
as aventuras contadas
no reencontro à mesa
regado a café com quitanda
e um rosário de surpresas
Ida bastante aturdida
estrada desconhecida
pernoite arranchados
caminhos desencontrados
Vinda’inda mais sofrida
inexperiente ajudante
extravio, assovio, berrante
cavalo empacado,
gado cansado,
tempo fechado
Ninguém que benzesse chuva
trovão, corisco, enchente
Nos perigos da travessia
aos santos de fé se pedia
Deus adiante e paz na guia
Não é nenhuma miragem
que às vezes a mente traz
são estórias de coragem
em detalhes relatadas
toda vez que o grupo chega
das longas viagens que faz